sábado, 27 de setembro de 2008

Projecto Fuga - Hermeticamente Fechado (2008)

Protagonista exímio de anedotas bem portuguesas, região onde as taxas de suicídio são elevadas, são muitos os clichés sobre o Alentejo. Encontrar nele nova música não foi fácil, quem o diz é JP Simões, o editor e "pesquisador" do KM0. Não foi fácil, mas valeu bem a pena.
A edição de hoje do programa transmitido pela RTP2 convenceu-me a olhar com mais atenção para o Projecto Fuga, bastante aclamado pela crítica.
Fuga é um projecto como poucos, é pop, alternativa, com toques de electrónica, de soul... de tudo. As participações especiais, do próprio JP a Adolfo Luxúria Canibal, passando pela brasileira Fernanda Takai, dos Pato Fu, dão a 01, o álbum de estreia, uma diversidade enriquecedora, um gostinho diferente a cada audição. Ao vivo a voz é sempre de Rosete Caixinha, uma voz para lá dos holofotes sintéticos dos programas de televisão.

O Alentejo é realmente uma caixinha de surpresas. Já o tinha percebido noutras ocasiões, vejo-o agora também na música. Para além do Projecto Fuga, a edição de hoje de KM0 introduziu-me à dupla Oxalá que, instalada num deserto monte alentejano, isolada de tudo, produz uma música chill out de horizontes bem abertos.

Proponho para hoje esse exercício poético que é Hermeticamente Fechado, um dos temas do primeiro álbum do Projecto Fuga. Suave, melódico, um arrastar de palavras simplesmente delicioso.

Projecto Fuga, Hermeticamente Fechado.

Obrigatório.

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"Será que um dia
alguém vai abrir o que se fechou
e descobrir
o que alguém deixou
hermético, sintético,
poético, magnético...
Coração."

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Chauffeur Navarrus - Juca Camaleão (2008)

Recebi hoje no e-mail mais um tema a incluir no primeiríssimo álbum dos Chauffeur Navarrus, Estradas Locais, que deve estar mesmo a rebentar nos escaparates.

Juca Camaleão é blues do melhor que se faz em português. Bom swing, a harmónica de João Coutinho com um protagonismo merecido e o trombone de Guida Costa a dar um toque big-band muito interessante. O resto é de uma competência de que nunca duvidei: Paleka, para mim o grande bluesman do Chauffeur - com direito a chapéu e tudo - , está em forma; o baixo sempre a pontuar, e a voz de João Navarro cada vez melhor. Os coros como sempre magníficos, uma verdadeira party track, como lhe chamaram, com palmas e gritos.

E depois há esta história de um tipo vigarista como muitos que encontramos por aí, que vai de Marrocos ao Japão, vender todo o tipo de coisas mesmo as que não interessam a ninguém. Até o fornecedor engana.

Venham daí essas estradas locais, que estamos a precisar de uns caminhos novos e menos congestionados por onde andar.

Juca Camaleão, pelo Chauffeur Navarrus.

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"Vendes óculos escuros, carros, esquemas e seguros,
és um artista!"

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

JP Simões & Luanda Cozetti - Se Por Acaso (Me Vires por Aí) (2007)

Sento-me ao computador com uma alegria quase adolescente, apesar do inchaço do lado direito da cara (um dente extraído...) e do saco de legumes a servir de compressa de gelo. Hoje conheci JP Simões, conheci mesmo. Já aqui falei do músico que descobri ser de Coimbra. Várias vezes até. A propósito do primeiro álbum a solo, 1970, e do programa que edita e apresenta aos sábados na RTP2, KM0.

Camisa branca, calças de ganga - magríssimo -, vejo-o entrar. O vai e vém por aquelas bandas é grande e não reparo, apesar de já estar à espera dele. Quando abre a boca para dizer Olá, boa tarde, aí reconheço-o. Não é o João, como teima em apresentar-se. É o JP Simões.

O que talvez não pareça óbvio, a julgar pelas suas canções, é o fantástico sentido de humor do músico. Conversar com ele é coisa de outro mundo.

Hoje proponho aqui Se Por Acaso (Me Vires Por Aí), na versão especialíssima em dueto com Luanda Cozetti, do excelente projecto Couple Coffee, aquando do lançamento de 1970. Dois músicos fantásticos, num tema tão simples - de travo a canção clássica - quanto belo.

É uma ode - arrisco dizê-lo - à vida citadina, à solidão que atravessa os corações cosmopolitas. Pelo menos vejo-a assim. Uma canção sobre encontros e desencontros, onde alguém diz "Quero que saibas que cago no amor, / Acho que fui sempre assim...", como quem diz ama-me, encontra-me.


Se Por Acaso (Me Vires Por Aí), JP Simões & Luanda Cozetti para ouvir.

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"Se por acaso me vires por aí
Vamos tomar um café
Diz qualquer coisa, telefona, enfim
Eu ainda moro na Sé"

terça-feira, 16 de setembro de 2008

The Legendary Tiger Man - I Got My Night Off (2006)

The Legendary Tiger Man é seguramente um dos projectos mais interessantes na já de si muitíssimo interessante cena musical portuguesa. Uma one-man-band que parece ter vindo das décadas de ouro dos blues, da brilhantina, do rockabily...

Femina, o aguardado novo álbum de Tiger Man, deverá estar nos escaparates em Março próximo. A voz de Peaches já está confirmada e outras vozes femininas deverão dar o seu contributo. Uma escolha que a mim me deixa ainda mais curiosa.

Este I Got My Night Off é de Masquerade, o último álbum de The Legendary Tige Man.
Enquanto Femina não chega, aproveite a sua noite de folga para ver e ouvir um dos mais estimulantes músicos da nossa praça.

The Legendary Tiger Man, I Got My Night Off.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Peltzer - The Great Ladder (2008)

A edição deste sábado de KM0 foi mais uma agradável viagem pelo que de melhor se faz nas salas de ensaio improvisadas por esse país fora.
Dizia-me alguém na semana passada que em Portugal, em música, pouco se faz e o que se faz não tem grande qualidade. Como o meu amigo está enganado, apeteceu-me dizer-lhe.

A minha proposta para hoje vem directamente de Tomar, à boleia de JP Simões. Chama-se Peltzer, e é um projecto de um só homem. Se fosse rock seria com certeza uma one man band. Não sendo, é estranho utilizar o termo. Não posso evitar comparações com Moby, por se movimentar nas estradas da electrónica e por decidir fazê-lo sem companhia. Boas canções, uma voz interessante (talvez até mais do que a do próprio Moby, não querendo esgotar aqui as comparações...), e, sobretudo, uma impressionante consciência da fase que a indústria musical atravessa por estes dias.

Foi essa lucidez que mais me impressionou no discurso de Peltzer. E é por estas razões que programas como KM0 não deveriam desaparecer das grelhas das televisões. Para além de divulgar a música, dar espaço para que os músicos expressem as suas opiniões e preocupações sobre o mundo discográfico é vital. Temos todos muito que aprender com isso.

Tem-me também impressionado um certo factor de "interioridade", apenas passível de ser apreendido quando se viaja de terra em terra. Este conceito de "interioridade" aplicado à música entende-se nas palavras de Peltzer quando diz que houvesse mais sítios para tocar ao vivo, Tomar seria palco da nova cena electrónica portuguesa. E o pior é que Tomar não é o único sítio onde as coisas fervilham sem que se lhes consiga dar vazão.

Para hoje, Peltzer, The Great Ladder.

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Ando há dias para perguntar isto:
por que é que toda gente deu agora para ouvir música nos telemóveis, sem phones?

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Ella Fitzgerald & Louis Armstrong - Dream a Little Dream of Me (1950)

Sentei-me do lado da janela, embora este em nada seja diferente do lado do corredor. Afinal, estava no metro. Da janela, nada para ver.
Sentei-me e um pensamento acorreu automaticamente, como aqueles "pensamentos mágicos" que formulava em criança, quando queria muito saber a resposta a uma coisa que tardava, quando queria, de certa forma, antecipar o futuro. Se o telefone tocar neste preciso momento... Se a próxima música a passar na rádio for cantada em português... Se... aquilo que queria realizava-se.

Esta manhã quando me sentei no metro tive um feeling. E, brincando um pouco com aquela ideia que me preencheu a infância, fiz uma espécie de "promessa". Dream a Little Dream of Me seria a canção do dia aqui no estaminé. Mas só se...

Ora, o se aconteceu mesmo, e aqui está uma vez mais, a grandiosa dupla do jazz, Ella Fitzgerald e Louis Armstrong. Promessas são promessas, por mais infantis que sejam.

Já nem sei o que dizer mais de Satchmo e da First Lady Of Song. Todos os que frequentam esta casa conhecem a minha admiração por eles. Dream a Little Dream Of Me começa com o trompete de Armstrong muito bem acompanhado pelo scat delicioso de Fitzgerald. Ella continua, desta vez com palavras, o trompete sempre a pontuá-la, depois é a vez de Louis Armstrong pegar nas palavras, arrastá-las. Fitzgerald acompanha-o num improviso e continua. Scat de Armstrong, scat de Ella. Os dois em coro. Uma simbiose perfeita.

É assim em Dream a Little Dream of Me. Ella Fitzgerald e Louis Armstrong.

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"Sweet dreams...
Till sunbeams find you
Keep dreaming...
(You gotta keep dreaming...)
Leave your worries behind you...
But in your dreams,
Whatever they be,
You gotta make me a promise:
Promise to me you'll dream...
Dream a little dream of me..."

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Bem, diria que começa aqui uma nova era para a pessoa que tem estado atrás do balcão deste estaminé.
Coisa que afectará o estabelecimento em si - parece-me - de forma positiva.
Pode demorar um bocadinho mais em algumas alturas, mas vai continuar a haver sempre por aqui uma música por dia! Pelo menos!

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Coldplay - Don't Panic (2000)

- Já ouviste isto?

- É o quê?

- Chamam-se Coldplay. Tens de ouvir.



E deu-me um dos phones para a mão. Foi assim que, numa viagem qualquer, me deram a conhecer a banda de Chris Martin. Uns tipos britânicos faziam um rock introspectivo, agri-doce, e lançavam o primeiro álbum, Parachutes.



Os singles não tardaram a passar em todas as rádios. Yellow, o primeiro avanço, pôs o nome Coldplay no mapa, apesar de, para mim, não ser o tema mais interessante do disco. Depois vieram Shiver, Trouble, Sparks e este Don't Panic, estas sim, grandes canções.



Já aqui falei da mais recente aventura dos Coldplay nos registos de estúdio, Viva La Vida or Death And All His Friends, disco que ainda não me convenceu totalmente. Violet Hill e o mais recente Viva La Vida já me soam melhor quando com eles me cruzo na rádio, mas falta-lhes aquele quê mágico que me fez gostar da sonoridade dos britânicos à primeira audição.



Por isso é que há pouco ouvir Don't Panic ao passar inadvertidamente pelo 30 Minutos da RTP soube-me a uma boa lembrança, como um pôr-do-sol esquecido.



Para recordar (já lá vão uns inacreditáveis 8 anos!), Coldplay, Don't Panic.



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"Bones, sinking like stones

All that we fought for,

Homes, places we've grown,

All of us are done for."

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Montecalvo146 - O Camponês Viu o Mar (2008)

A música de hoje é uma sugestão vinda directamente da edição deste sábado de KM0. Perto de Santa Maria da Feira, em Montecalvo, no número 146, JP Simões e equipa descobriram... os Montecalvo146.

Donos e senhores de uma interessante sonoridade experimental e electrónica, aliada a uma poesia do canto falado, os três músicos lançaram este ano o primeiro CD promocional, Chaves de Casa.

Nele, Cristiano Moreira, Lionel Fernandes e Ricardo Raimundo juntaram experiências em forma de faixas. Umas mais electrónicas, outras mais melódicas, umas mais bem conseguidas outras menos. Chaves de Casa, disponível para download no MySpace da banda, inclui até uma revisitação do clássico tema de Carlos Paião Cinderela, a que deram o nome de Cinderela Nulla Vita, na minha opinião o menos inspirado dos 4 temas de apresentação.

Canção tocada ao vivo para o KM0 e para mim o melhor tema de Chaves de Casa, O Camponês Viu o Mar é um grandioso cartão de visita para os Montecalvo146. Poesia em palavras e sons, samples muito bem escolhidos, o tema é um grande exercício de inspiração e vai-me fazer seguir de perto o percurso da banda de Santa Maria.

Ao ouvi-los não posso deixar de associar-lhes algumas sonoridades, muito embora não tenha ideia se sejam ou não efectivas influências. Ricardo Raimundo faz-me de alguma forma lembrar o estilo de Pedro D'Orey nos Wordsong e também, mas mais vagamente, o de uns Mão Morta mais calmos e electrónicos. Meras suposições.

Os factos são estes: Montecalvo146 é uma localização a reter.

Para hoje e para começar, O Camponês Viu o Mar, Montecalvo146. Obrigatório.

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"Ouve lá, já viste o mar?
Dizem-lhe o infinito,
Dizem que toca ao longe o céu
E que dele se torna
Indistinto.

Dizem que é de um azul imenso
E dizem também,
Para espanto meu,
Que não é dele a cor azul
Mas da vontade do céu."