quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Pearl Jam - Wishlist (1998)

Eu devia estar aqui a escrever sobre o maravilhoso disco do Kurt Vile ou o do Mazgani, ou então de todas aquelas coisas boas que tenho ouvido ultimamente e que estão em lista de espera. Mas teve de ser. Bom ano para todos os que vão passando por aqui e, para aqueles que voltam e que uma vez e outra não encontram nada novo, saibam que por aqui há sempre música todos os dias. Quer cá esteja em palavras, quer não. :)

Quando comecei a ouvir Pearl Jam, Wishlist era aquela canção de que eu menos gostava. Ouvia- a na rádio e ficava incomodada, inquieta. Se passava enquanto dormia, sobressaltava-me, perturbava-me. Talvez não compreendesse completamente a mensagem (há coisas que só os anos nos dão) e a sonoridade não era a clássica da banda de Seattle. Não sei se era por isso, mas pode ter sido.

Um dia – um qualquer dia – ouvia-a de outra maneira. E a canção que outrora eu passava à frente ou fingia não ouvir quando ia no carro, passou a significar outras coisas. Na verdade, passou a significar, ponto. Nesse ano - também nos últimos dias desse ano – fiz a minha wishlist, com excertos da música e desejos meus. Eram centenas. De todos os feitios, uns fáceis, outros difíceis de concretizar. Coisa de adolescente, o objectivo era riscar cada sonho à medida que fosse sendo cumprido. Com data e a cor diferente e tudo. Dobrei as folhas e guardei-as dentro de um livro. Durante alguns anos lá ia eu, a cada conquista, riscar a frase correspondente ao desejo realizado. Depois, como todas as coisas de adolescente, também a wishlist foi ficando esquecida. Há anos que não risco nada naquelas páginas, apesar de os últimos anos me terem dado bons motivos para isso.

Mais um ano chega ao fim e voltei a lembrar-me de Wishlist, já, e merecidamente, no saco das grandes canções. Há uma versão de que eu gosto particularmente: a tocada ao vivo, no Madison Square Garden, em Agosto de 2003. “I believe.”, começa por dizer Eddie Vedder, e depois começa o inesquecível riff de guitarra. Por cima do público há uma bola de espelhos. Arrepio-me sempre que ouço a guitarra de Vedder a distorcer. Leva as mãos à cabeça, estala os dedos, volta para a guitarra límpida e solta um estonteante “Fuck the pessimists. Fuck ‘em!”. O público aplaude. “This proves that dreams could be a good thing”, continua o vocalista, e agradece aos Buzzcocks, companheiros da noite. Incita o público a cantar.
“That’s fuckin’ beautiful”. Eu também acho, e por isso é que esta é a música do dia, do último dia do ano.
As canções são coisas vivas quando as bandas fazem delas coisas vivas.
Wishlist, os Pearl Jam no Madison Square Garden.
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“And it feels so real I can feel it, and it tastes so real I can taste it, and it sounds so real I can hear it… But why can’t I touch it?”

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Mayer Hawthorne - Just Ain't Gonna Work Out (2008)

Era sexta-feira 13. Sem pensar sequer em superstições ou azares, fiz o meu percurso habitual para o trabalho, em modo quase automático. Mas nessa sexta não passei, como costuma ser hábito, pela papelaria da estação de metro. Passei as cancelas, esperei os habituais segundos pelo metro, sentei-me, mas não pus os phones nos ouvidos. Não tinha jornal para ler, nem música para ouvir. Nesta distracção do nada fazer, falhei a estação de saída, e em vez de ter descido na Baixa, como todos os dias faço, fui dar um breve passeio até à estação de Santa Apolónia.

Nessa sexta-feira 13, o Ípsilon escrevia sobre Mayer Hawthorne. Não comprei o jornal nessa manhã. Nos dias seguintes, passei pelo site do suplemento e, como sempre, reparei nos títulos principais (ler a sério, só no papel e a bordo do metro). O nome não me dizia nada. Retive as palavras "crooner" e "soul clássica", "copo de leite", "coração negro" e a imagem engraçada do músico americano. Não li o artigo logo. De cada vez que entrava no site, uma expressão diferente saltava à vista. Uma noite "o branco mais preto de 2009" bateu-me nos olhos. Juntei a engraçada frase às excelentes referências (o melhor disco de soul, o descendente da Motown, Whinehouse versão masculina...) e nessa noite não resisti e li o artigo e procurei logo a página Myspace de Hawthorne.

Já não terminei de ler. Fiquei completamente rendida. A tudo. Mayer Hawthorne é mesmo um branco com alma de negro - os grandes da melhor tradição Motown. Faz soul clássica, mas não está preso ao passado. A música deste americano - que também é Dj, rapper, engenheiro de som, multi-instrumentista e produtor - soa a hoje. A um hoje que pisca o olho aqui e ali. Maybe So, Maybe No faz me querer dançar, este Just Ain't Gonna Work Out já está entranhado ao ponto de dar comigo a cantarolar histórias de desgraças amorosas como se isso fosse a coisa mais bela do mundo. É que na voz de Hawthorne é mesmo a coisa mais bela do mundo. Há charme, mas não em demasia e a figura do música contraria toda aquela ideia gasta do Don Juan.

Hoje parece que tudo o que é old school é moderno. Nem tudo. Mas em Hawthorne, o facto de fazer as coisas à moda antiga também me conquistou: primeiro vêm os singles, em vinil, como manda(va) a tradição. E se um 7 polegadas em forma de coração, bem vermelho, pode parecer coisa pirosa, meus amigos, pelas mãos de Hawthorne qualquer resquício de coisa kitsch e demodé vai à vida.

Usar risco ao lado, colete, fato, gravata, óculos grandes de massa, ser branquinho, low-profile, lançar singles em vinil (em forma de coração ou a imitar pele de corcodilo), falar com todas as letras de amores e desamores, voltou a ser não só muito cool, como deliciosamente sexy!

Com Mayer Hawthorne.


Eu já encomendei toda a discografia. Vinil em forma de coração incluído. Aconselho toda a gente a fazer o mesmo.

Just Ain't Gonna Work Out, Mayer Hawthorne. Quero este homem em Portugal! Já!

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"Don't wanna see your tears
Baby it will be ok
Don't wanna see you cry darling
No way!
But it just don't feel the same
(just don't feel the same)
I know what you're about
(I know what you're about)
And I guess that I don't love you anymore

And I'm sorry, but it just ain't working out
I'm sorry, it just ain't gonna work out"

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Bob Dylan - Blowin' In The Wind (1962)

Em 1962 Bob Dylan escreveu Blowin' in the Wind. Ou melhor, não escreveu. A canção já lá estava, quando ele chegou, disse, da primeira vez que a apresentou ao vivo.

Hoje, quase 50 anos depois, ouço a canção numa rádio on-line. Não consigo. Tenho de parar o que estou a fazer para ouvi-la com atenção, uma vez mais. Atento em cada verso.

À medida que as perguntas se sucedem, sinto-as como minhas. Não há ninguém que não as tenha feito. São as perguntas que, conforme embatem, são capazes de magoar, de rasgar. São as perguntas que fazemos para dentro e as que fazemos ao mundo. São as perguntas constantes, eternamente perguntas. Podem parecer retóricas, mas não as queremos assim. Levamos as mãos à cabeça e formulamo-las outra e outra vez. Cada vez mais interrogativas, à medida que se repetem são assim estas perguntas.

E a resposta, meus amigos... A resposta, essa... A resposta... is blowin' in the wind.

Para o caso de haver uma única alma em dúvida, mais uma oportunidade para perceber que se fala de um génio quando se fala em Bob Dylan.

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"How many roads must a man walk down
Before you call him a man?
Yes, 'n' how many seas must a white dove sail
Before she sleeps in the sand?
Yes, 'n' how many times must the cannon balls fly
Before they're forever banned?
The answer, my friend, is blowin' in the wind,
The answer is blowin' in the wind.

How many years can a mountain exist
Before it's washed to the sea?
Yes, 'n' how many years can some people exist
Before they're allowed to be free?
Yes, 'n' how many times can a man turn his head,
Pretending he just doesn't see?
The answer, my friend, is blowin' in the wind,
The answer is blowin' in the wind.

How many times must a man look up
Before he can see the sky?
Yes, 'n' how many ears must one man have
Before he can hear people cry?
Yes, 'n' how many deaths will it take till he knows
That too many people have died?
The answer, my friend, is blowin' in the wind,
The answer is blowin' in the wind."

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Charles Wright & The Watts 103rd Street Rythm Band - Express Yourself (1971)

No final dos anos 60, e em plena década de 70, depois dos hippies, a mensagem de liberdade veio da voz e do suor da comunidade afro-americana. Talvez não tenha sido uma revolução tão política, como foi a dos hippies, mas o funk fez a revolução do corpo. Tanto por explorar ritmos que se infiltram nos corpos e os fazem dançar de todas as maneiras e feitos, como pelas mensagens que passa: faz aquilo que tens que fazer. Aquilo que gostas. Solta-te.

Para mim, toda a essência da mensagem funk está neste Express Yourself, embora não seja o mais efusivo dos clássicos do género. É que está lá tudo. O assumir de uma sexualidade que faz bem, o reconhecimento (e mais que isso...) do corpo, a liberdade de se ser quem é e de o dizer sem preconceitos. É um hino à tua liberdade mais íntima, àquela que, nestes tempos tão modernos, parece ficar esquecida, relegada para segundo plano. Somos livres, democraticamente livres, legalmente livres, mas nem todos conseguimos o prodígio de sermos livres connosco próprios. O funk é isso.

Também é ritmo, também é dançar até que os pés doam e o suor escorra pela cara e pelas costas abaixo, também é libertação do corpo e da mente. Também, também...

Express Yourself, de Charles Wright, não é um pedido. É uma ordem.

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"Some people have everything, and other people don't.
But everything don’t mean a thing if it ain´t the thing you want.
Express yourself!"

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Não podia deixar de lembrar aqui a perda que foi a morte inesperada de António Sérgio. Foi também por causa dele e da sua Hora do Lobo que me apaixonei pela rádio, que me apaixonei cada vez mais por música e pela divulgação. Talvez a única forma verdadeiramente digna de se lhe prestar homenagem, para além de todas as palavras, é continuarmos todos a ouvir e a apoiar a boa música que se faz, aqui e ali.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Alice In Chains - Last Of My Kind (2009)

Dei comigo a pensar, durante toda a semana, sobre as bandas que "substituem" membros. Geralmente o resultado desilude. Lembro-me da reunião dos Queen sem Freddie Mercury ou dos Doors sem Jim Morrison ou até dos Guns 'n' Roses sem... toda a gente menos Axl Rose.

Mas nem sempre é assim. Os AC/DC, por exemplo, souberam continuar sem o malogrado Bon Scott, e Brian Johnson quase fez esquecer o anterior vocalista, tal foi a simbiose perfeita com a banda. Sei que ainda é cedo, mas é mais ou menos esta a sensação que tenho quando ouço Black Gives Way To Blue, o novíssimo álbum dos Alice in Chains. O 1º sem Layne Staley. William DuVall acenta que nem uma luva na sonoridade do grupo, muito embora a herança de Staley, a importância e o carisma do eterno líder dos AiC, seja insubstituível. Para mim, os Alice in Chains são e sempre serão a banda de Layne Staley e Jerry Cantrell. Infelizmente, o primeiro já cá não está. Mas está DuVall para homenageá-lo, para dar continuidade, em respeito, ao seu trabalho.

Não estava à espera de encontrar todos os pontos característicos da sonoridade dos AiC no álbum, muito embora A Looking In View, o primeiro single desse a entender que assim seria. Estão lá as guitarras distintivas do grunge impregnado de metal, estão lá as letras, está a voz de Cantrell a ajudar, a introdução de Check My Brain não me sai da cabeça (como antes tinha acontecido com Again ou We Die Young), a melancolia de Your Decision agarra-se à pele, Acid Bubble é uma canção cheia de camadas por descobrir, Black Gives Way To Blue é quase um Down in a Hole mais reconciliado e o refrão deste Last Of My Kind é qualquer coisa...

É talvez nas canções menos agitadas que se sente mais a falta que faz o carisma, a voz inconfudível de Layne Staley. De resto, Duvall é um vocalista competentíssimo para os Alice in Chains. Todo o disco cheira a homenagem. É um conceito um pouco difícil de explicar. Não sei em que é que Jerry Cantrell estava a pensar. Não sei como as coisas se deram. Mas ao ouvir Black Gives Way To Blue não sinto qualquer pudor, qualquer medo de trair a memória de Staley, sinto sim um enorme respeito por um trabalho de anos, que marcou muita gente.

Marcou-me a mim, seguramente. E é bom sentir isso de novo.

Dizia um jornalista, há tempos, que, onde quer que estivesse, Staley estaria com certeza a sorrir. Também não tenho dúvidas nenhumas disso.

Last Of My Kind, os Alice in Chains.

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"Trapped in the cold outside
There ain't no shelter
They wanna force my hand
Until I...

Take what I wanted, and
Break all the lies that they
Feed the fuckin' liars...
Smash all the temples, and
Crawl through the rubble, and
Cry to the fallen

I'm the last of my kind still standing
I'm the last of my kind still standing down the law"

domingo, 4 de outubro de 2009

The Legendary Tigerman & Cláudia Efe - Light Me Up Twice (2009)

Há já alguns meses que ando a ouvir Femina, ainda que inacabado, por conta de um trabalho que fiz. E só Deus sabe o esforço que fiz para não começar a falar aqui das brilhantes canções do novo álbum do alter-ego de Paulo Furtado, uma por uma.

Depois de alguns atrasos, aquele que é mais que um simples disco de duetos com mulheres, chegou no dia 28 aos escaparates. A Fnac do Chiado encheu nessa segunda-feira e o Lux também, na quarta, para ver o (cada vez menos) solitário homem-tigre.

Desde os primeiros minutos que Femina me deixou rendida. A ideia é brilhante, mas mais brilhante ainda é a forma como é executada. A escolha das vozes femininas que povoam o disco foi improvável mas certeira. Podia ter-se ficado por meia dúzia de clichés, podia ter explorado apenas e só a fórmula mágica do dueto, mas é claro que Paulo Furtado não queria ir por aí. Sou fã confessa do trabalho do músico de Coimbra, ainda assim surpreenderam-me, sem excepção, todos os temas. Gostei das sonoridades (mesmo das mais ovni) diferentes que Tigerman escolheu em função das convidadas, adorei as letras, as cumplicidades que se criaram e que se ouvem. Arrisco-me a dizer que este é um dos álbuns nacionais do ano, senão mesmo o álbum do ano.

Life Ain't Enough For You podia não ser o single óbvio, à primeira vista. Acaba por ser tanto mais óbvio quanto mais se conhecer a história por detrás de Femina e que tem como "musa principal" Asia Argento. As minhas primeiras audições puseram no meu top 5 & Then Came The Pain, com Phoebe Kildeer: um tema forte, com um diálogo tenso e umas guitarras de cortar o fôlego. Depois apaixonei-me por Becky Lee e o seu pé bêbedo de I'm in Love With An Old Fashioned Man, mas principalmente por culpa de No Way To Leave on a Sunday Morning, em que acompanha um Paulo Furtado num registo delicioso. Em She's a Hellcat, Peaches contribui com o seu "pequeno rap", Furtado aventura-se por outras sonoridades. Maria de Medeiros dá a These Boots Are Made For Walkin' uma inocência para lá de deliciosa (embora não ache o tema merecedor de honras de 2º single...), e My St0mach is The Most Violent Of All Of Italy mostra uma Asia Argento bem diferente da do 1º avanço.

Ao vivo as coisas ganham sempre outra dimensão, para mim (e calculo que para os artistas ainda o seja mais) é quase como fazer uma prova dos 9 em presença. No Lux, Lisa Kekaula pôs o público em alvoroço com uma presença desarmante. 20 horas de viagem para encher aquele palco durante os pouco mais de 2 minutos irrepreensíveis de The Saddest Thing To Say, o tema mais soul do álbum. Apesar de me ter parecido a colaboração mais apagada no disco, ao vivo Rita Redshoes surpreendeu-me. Mais com o deslumbrante (e agora revelado) Hey, Sister Ray do que com a cover para Lonesome Town. Apaixonei-me completamente pelo vozeirão de Cibelle, cujo trabalho conhecia pouco, e que ainda não tinha ouvido com Tigerman. Esperei ouvir Radio & TV Blues, o tema que Paulo Furtado diz - e eu também concordo - ter o melhor verso de todo o álbum: "Give me some red poison mixed with LSD, 'cause it makes me feel so much better than fuckin' MTV".

Outro dos grandes versos de Femina é o que abre este Light Me Up Twice, com Cláudia Efe. Para confirmar. The Legendary Tigerman & Cláudia Efe.

(Ah, e escusado será dizer que este é um álbum mais que obrigatório. É vital.)
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"God is everywhere. Under a woman's skirt and inside a man's pants."

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Xutos & Pontapés - Não Sou o Único (1987)

No sábado estive no Restelo. Eu e mais de 40 mil pessoas. Para ver os Xutos & Pontapés.

Quando entrei o emaranhado de gente já passava - e muito - do meio campo. Furámos por entre o público mais ecléctico que se possa imaginar. Novos, velhos, de preto, de branco, com maquilhagem ou suor no rosto, com copos de cerveja ou tubos de pasta de vodka na mão, uns pequeninos pelas mãos dos pais, uns sentados no chão, outros de pé, muitos lenços vermelhos, brancos e laranja, muitas t-shirts, bandeiras e bóias. Cheiro a tabaco, charros, transpiração e álcool. Muitos repetentes, poucos estreantes. Uns mais no espírito que outros.

Ficámos junto ao prolongamento do palco. Eu e o meu irmão fazíamos apostas sobre a canção de abertura. Concordámos que seria do novo e homónimo álbum. Talvez não fosse o single, muito menos seria Sem Eira Nem Beira, que só podia estar guardada lá mais para a frente. Apostei em Tetris Anónimus. O Fábio ganhou. Afinal foi mesmo Quem é Quem que abriu a noite.

O que se passou nas 3 horas seguintes nem toda a gente entende. Só quem cresceu a ouvir os Xutos é que percebe o que se sente ali no meio. Não é preciso ter estado lá, na cave, em 79. É preciso ter crescido ao som disto, tenha sido nos anos 70, 80, 90 ou 2000.

Já perdi a conta às horas que passei a ouvir os discos, os concertos a que fui, as coisas que li. Não há outra banda que me diga mais. Das canções mais antigas às mais recentes, estão lá muitos episódios, muitos ideiais partilhados, muitas histórias de vida, muitas preocupações, muitos desabafos. Está lá isso tudo. Quantas vezes não pensei na Morte Lenta, no Medo, nas palavras de Quando Eu Morrer rabiscadas nos cadernos da escola? Comigo também era sempre assim: eu sei lutar até ao fim, é tudo ou nada, como na canção que eu adorava ouvir também na voz do Tó Trips, dos Lulu Blind.

Mais tarde senti o que era a vontade de embarcar nos Barcos Gregos: faltava-me o ar, faltava-me o emprego p'ra cá ficar. Por vezes vi a vida torta, jamais se endireitava, como num Circo de Feras. Apaixonei-me vezes sem conta ao som de Conta-me Histórias. Ainda hoje não conheço versos tão sábios como os do Homem do Leme. Vi tantos filhos da puta sem razão e sem sentido nesta cidade, quis deixar a carga pronta e metida nos contentores. Disse Olá à vida Malvada, aprendi a tocar guitarra com N'América. Quis tudo À Minha Maneira, fiz filmes inspirados em Enquanto a Noite Cai, arrepiava-me com Doçuras. Diverti-me com Para Ti Maria e Sou Bom. Chorei muitas vezes ao constatar que vivia num Pêndulo imparável. Gritei Gritos Mudos, acreditei num Futuro Que Era Brilhante. Acordei em Lugar Nenhum tantas vezes, apanhei tanta chuva dissolvente no meu caminho de casa... Ainda hoje acho que está tudo mal, tudo mal, que a política está em estado de Estupidez, que o dinheiro para mim não conta, eu trabalho por prazer, mas também sabe bem ter um ordenado ao fim do mês, um dia de S. Receber. Fui uma ovelha negra, carneiro preto, fui direito ao deserto. Já não tenho paciência para as misérias de quem manda nesta terra do sem-querer, nem para jogos do empurra. Dei muitos mergulhos no mar e espero continuar a dar. Vi o panóptico das aulas da faculdade em Privacidade. Tantas e tantas vezes senti que tinha chegado o momento de correr tanto ou mais que o vento, de correr tanto ao mais que o tempo... ah, mas não foi assim. Desci ao Inferno, vi o Mundo Ao Contrário, passei pela Zona Limite, projectei a minha própria Sombra Colorida. Pensei para comigo que na verdade eu não sou de cá, vivo em permanente Estado de Dúvida, e não há nada melhor que o Amor Com Paixão. Vejo Sócrates e todos os outros políticos em Sem Eira Nem Beira.

Sei que não sou um caso isolado, não sou a única. Não!

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"Pensas que eu sou um caso isolado
Não sou o único a olhar o céu
A ouvir os conselhos dos outros
E sempre a cair nos buracos
A desejar o que não tive
Agarrado ao que não tenho
Não, não sou o único
Não sou o único a olhar o céu"

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Amália Hoje - Gaivota (2009)

Ainda hesitei. Sempre quis que este 1 Música Por Dia fosse desse espaço àquelas coisas que eu considero essenciais de ouvir. São as minhas opiniões, o lado crítico e pessoal da minha relação com a música. Não evito falar mal. Mas há tanta coisa que eu considero essencial na minha lista de espera - coisas sobre as quais eu quero tanto falar - que nunca quis "perder tempo" a escrever sobre projectos que não me tocam ou, simplesmente, que não gosto.

Hoje vou quebrar essa minha regra pessoal e vou escrever sobre uma coisa de que, definitivamente, não consigo gostar. Abro a excepção aos Amália Hoje - ou só Hoje - , por culpa do Rui Miguel Abreu, que hoje assina um excelente artigo na Blitz deste mês.

Vamos por partes. Não fui daquelas pessoas que condenou à partida o projecto - porque estaria a trair a obra de Amália ou por outras razões igualmente tradicionalistas. Só comecei a não gostar de Amália Hoje quando ouvi pela primeira vez Gaivota. Uma ideia que à partida não é má de todo - a de resgatar a obra de uma figura de proa da música portuguesa - peca, de resto, em quase tudo. Nos arranjos, que não são de hoje nem de ontem, muito - demasiado - à là Gift, na dificuldade em encontrar o registo certo, até na imagem a banda exagerou.

Fiquei desiludida, ao conhecer melhor o projecto. Porque teriam Paulo Praça, Sónia Tavares e Fernando Ribeiro embarcado num projecto que, parece-me, diz-lhes tanto a eles quanto a mim? Porquê fazer algo que - e nota-se a milhas - os deixa desconfortáveis, rígidos? A dúvida assolou-me ainda mais quando comecei a ver a escalada de popularidade que os Hoje começavam: vendas estrondosas, concertos esgotados em salas gigantescas. Apesar de tudo, não conseguia gostar de nada ali.

Hoje percebi. Ou melhor, confirmei suspeitas. Rui Miguel Abreu fez aquilo que eu tinha vontade de fazer há já algum tempo: entrevistou não só a banda como uma representante da Valentim de Carvalho, e responsável pelo projecto. Um trabalho brilhante, isento, que dá gosto ler.

E está lá tudo. Paula Homem, da Valentim, explica como surgiu a ideia, associada a uma necessidade de marketing para vender um filme sobre Amália à camada mais jovem. Nuno Gonçalves, o produtor, confessa que não ficou convencido quando lhe encomendaram o projecto. Não percebia nada de fado, não conhecia a discografia de Amália. Tal como Sónia Tavares, que entrou na aventura nas mesmas (e ingénuas) condições. A cantora dos Gift diz mesmo que a ideia foi difícil de entranhar e que não gostou das ideias inicialmente propostas por Nuno Gonçalves. Só Fernando Ribeiro estava mais próximo da obra de Amália, mais igualmente afastado do objectivo pop da Valentim de Carvalho.

"Na conversa com os músicos e editores deste projecto, ninguém tenta passar a ideia dos Hoje serem um projecto natural, nascido devido ao amor comum a uma causa ou a uma obra. Pelo contrário, a ideia que vai passando nos discursos de cada um dos intervenientes é precisamente contrária, de alguma resistência em abraçar o projecto", constata Rui Miguel Abreu, a linhas tantas. Eu acrescentaria que isso se ouve em cada tema do álbum. Tudo ali me soa a encomenda, a algo pouco natural, a um sacrifício feito em nome de mais um desafio superado. Não vejo ali Amália, não vejo ali nada de novo, nem de interessante. Os arranjos não me tocam, não vejo sentimento naquelas vozes nem naquelas notas, nem naqueles ambientes tão orquestrais. Não vejo o hoje nem o ontem. Não vejo sequer um objectivo, quanto mais artístico (o de dar a conhecer Amália, o de revisitar a obra, o de criar algo de novo a partir de algo que se admira).

Mas não posso deixar de louvar a disponibilidade destes músicos para mostrar todas as fragilidades do projecto, as dificuldades, as incertezas, a ingenuidade, e, claro, a perspicácia e profissionalismo do jornalista. Talvez agora os entenda melhor, embora continue a achar - e cada vez mais - que é um projecto infeliz e vazio, do ponto de vista artístico. Porque do ponto de vista comercial, está longe de ser um fracasso.

Amália Hoje é um (im)perfeito coração, como disse uma vez um crítico. Mas é sem dúvida um perfeito plano de marketing.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

The Vaselines - Son Of A Gun (1987)

Sei que não fui a única a conhecer os Vaselines através dos Nirvana e de covers de canções como este Son Of A Gun. Até hoje - o dia em que me chegou às mãos a deluxe edition de Enter The Vaselines, o duplo álbum com toda a discografia remasterizada e alguns bónus da banda de Eugene Kelly e Frances McKee - ainda não consegui entender como é que os Vaselines passaram despercebidos e constam tão ao de leve na história da música indie.

Não fosse Kurt Cobain, fã confesso da dupla escocesa, talvez os Vaselines não tivessem chegado a tanta gente. (A propósito, quantas bandas fizeram questão de revisitar bandas improváveis e pouco conhecidas e até de levá-las a subir ao palco?)

E o que é que os Vaselines têm? Para além de duas vozes transbordantes de carisma por, precisamente, estarem-se completamente nas tintas para o carisma; para além da irónica ingenuidade com que falam de sexo; para além das buzinas em Molly's Lips; da frontalidade absolutamente desarmante de Rory Rides Me Raw; da pronúncia fazer transformar "ugly" em "uguly"; das guitarras ora garage ora mais country; do ritmo frenético e viciante de Dum Dum; da sonoridade crua vinda directamente da garagem; para além disto, os Vaselines têm tudo. É aquela coisa a que alguns chamam honestidade. Ou verdade.

Foi certamente por isso que Cobain disse um dia que Kelly e McKee eram os melhores compositores de sempre.

The Vaselines, Son of a Gun.

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"The sun shines in the bedroom when you play,

And the raining always starts when you go away."

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Jazzanova & Phonte - Look What You're Doin' To Me (2008)

Miguel Esteves Cardoso não está sozinho quando diz que sente uma curiosidade incontrolável quando vê alguém de phones nos ouvidos, ao entrar no metro. Eu também partilho dessa forte sensação.

Voltei esta semana ao trabalho e, consequentemente, às viagens de metro. Entro, sento-me, às vezes também eu ponho os phones nos ouvidos, mas quando não ponho não consigo evitar: deixo-me levar pela imaginção e faço apostas sobre o que é que os dois passageiros da frente e o que ocupa o lugar mesmo a meu lado estão a ouvir nos seus leitores. Porque são poucos aqueles que viajam sem música. Aposto que o rapaz de barba mal semeada, mala a tiracolo, camisa às riscas e ténis gastos ouve as últimas do indie-pop. Que descobertas terá ele feito nas últimas semanas? A rapariga que encontro dia sim, dia não na estação da Pontinha - de cabelo muito preto e liso, unhas inpecavelmente pintadas, cores vibrantes e roupas da moda - deverá ouvir as novas tendências da pop e do r&b. Será mesmo assim? Nunca consigo descobrir. A viagem chega ao fim e eu não sei o que os outros ouvem e ninguém saberá aquilo que ouço todos os dias durante aquele percurso.

A internet é a casa de chocolate dos melómanos gulosos. Basta passar pelo Myspace, pelos blogues e revistas on-line para se encontrar música nova. Já não é preciso esperar pelos programas de autor que passavam a altas horas nas rádios, já não é preciso estar atento ao crítico X ou Y, já nem é preciso ir ver as novidades às lojas.

Mas ninguém me tira aquela ideia (acho que a roubei também do MEC, na altura no Blitz) de nos sentarmos no tapete da sala, ao pé de aparelhagem, com pilhas de discos de um lado e um amigo curioso do outro. O tapete pode até ser virtual, em vez de Cds, vinis e cassetes empilhados podemos ter links e ficheiros mp3, se a ideia original for demasiado exigente.

Como me disse o Henrique Amaro certa vez, o divulgador hoje pode ser qualquer pessoa. Pode ser um amigo que te apresenta uma música no rádio do carro ou de casa ou até no computador. Pode ser o locutor de rádio. Pode ser o crítico musical num jornal de referência. Pode ser um anúncio de televisão ou um filme. Pode ser uma coincidência. Pode estar a teu lado no metro.

E também pode ser outro músico. Nos últimos tempos tenho feito descobertas muito interessantes através de colaborações entre músicos. Dificilmente prestaria atenção ao trabalho do rapper/soulman Phonte Coleman se não me tivesse apaixonado por este Look What You're Doin' To Me, de Of All The Things, o último álbum dos Jazzanova. E isto é só um exemplo tosco.

Jazzanova, Look What You're Doin' To Me.

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"And when the day comes and everybody's gone,
You can call me a friend
I'll be here for your new beginnings and I'll be here in the end...

Gonna tell the world I love you, baby girl
Shout it out in the streets
Gonna talk about the joy you bring me, girl
Look what you're doin' to me."

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

David Fonseca - A Cry For Love (2009)

Corro o sério risco de levar um raspanete de alguns amigos meus depois daquilo que já disse e vou dizer agora aqui. É que alguns deles são fiéis seguidores do David Fonseca e eu, confesso, já tive as minhas "desavenças" com o músico.

De maneira que, quando chega material novo do ex-Silence4, os fãs rejubilam, lançam foguetes, ficam ansiosos e eu... ponho o meu pé atrás não vá surgir dali um segundo Someone That Cannot Love.

Talvez por causa destas minhas reservas, não gostei imediatamente de A Cry For Love, quando a ouvi pela primeira vez na rádio. Aos poucos e poucos, aquilo que me parecia mais do mesmo, uma melodia simples, um registo vocal pouco interessante ou carismático, começou a revelar-se uma boa canção. Ainda não é brilhante, mas ainda assim é uma boa canção. E já começo a sentir vontade de descobrir o álbum, previsto para Outubro.

Às vezes dou comigo a pensar numa coisa curiosa: apesar da legião de fãs que David Fonseca já tem e de eu ser uma espécie de fã intermitente, parece-me que, ainda assim, ele é um pouco subestimado. Ok, os álbuns são sempre estrondosos sucessos, os lançamentos e concertos estão sempre à pinha, a relação com os fãs é inacreditável, mas... parece que falta ali qualquer coisa. A coisa pode ser o reconhecimento como artista e não apenas como talentoso fazedor de canções.

É que ele está muito para além disso. Para além das canções e das multidões.

Enquanto não há mais, A Cry For Love. David Fonseca.

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"I jumped to the water, I swam to the shore
Turned up at your doorstep, I slept on your floor
I woke up in panic, I dreamt you were gone
You're gone, you're gone"

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Nouvelle Vague - Dancing With Myself (2004)

Uma noite destas deu-me uma vontade incontrolável de desenterrar os clássicos de Billy Idol. Na verdade, eu sabia que estava calor na cidade nessa noite e o tema surgiu na minha cabeça claro como água. Depois seguiu-se White Wedding, Sweet Sixteen, o incontornável Rebel Yell, Eyes Without a Face e este Dancing With Myself. O tema que arranca sorrisos e troças, a conhecida canção da masturbação (ou sobre o episódio dos espelhos a que Idol assistiu nas ruas de Tóquio...) foi resgatado aos anos 80 pelos Nouvelle Vague.

Já aqui falei deste engraçado projecto francês. Se a década de 80 é o maior de todos os guilty pleasures de uma certa geração de melómanos como eu, os Nouvelle Vague são um prazer culpado, mas docinho.

É claro que continuo a preferir as palmas aos estalos de dedos, e continuo a vibrar mais com as guitarras que com o contrabaixo swingado, mas não deixa de ser divertido ouvir Dancing With Myself cantado com a ingenuidade e doçura da cover dos Nouvelle Vague.

Tal como existem todos os tipos de raparigas no mundo, também existem versões de Dancing With Myself para todos os gostos e estados de espírito. Esta é a dos Nouvelle Vague.

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"So lets sink another drink
'cause it'll give me time to think
If I had the chance
Id ask the world to dance
And I'll be dancing with myself"

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Becky Lee And Drunkfoot - Old Fashioned Man (2008)

Contam-se velhas histórias sobre one-man bands. Foram invenções práticas, principalmente para músicos de rua: não estavam dependentes de outros músicos e podiam andar por aí à boleia, com uma guitarra, uma mini-bateria e a obrigatória harmónica. Por outro lado, também não é difícil imaginar que, numa época em que o acesso aos discos era limitadíssima e as novas sonoridades vinham pelas ondas da rádio, o mais fácil era pegar no que estava mais à mão e imitar da melhor forma aquilo que se ia ouvindo.

Hoje, as one-man bands podem nascer da simples ideia get yourself a band!, nem é preciso mais. Eu, confesso, sou fã desta forma solitária de fazer música! Para quê complicar quando uma guitarra, um kit básico de percussão e aqui ou ali uma harmónica conseguem fazer passar a mensagem? O resultado não poderia ser mais delicioso: um som cru, puro.

Becky Lee And Drunkfoot é uma das poucas one-(wo)man bands. Já esteve em Portugal umas poucas de vezes e tem colaborado com os portugueses A Jigsaw e The Legendary Tigerman. Se, à primeira audição, a voz não me convenceu, bastou umas incusões mais atentas pelo myspace para me apaixonar pela americana e pelo seu pé bêbedo! É rock 'n' roll, é blues, é country, é o que ela quiser.

Escolhi para hoje Old Fashioned Man, um tema que parece tão clássico como o próprio homem de que fala. Delicioso e, como não podia deixar de ser, obrigatório.

Becky Lee And Drunkfoot, Old Fashioned Man.

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"I'm in love with an old fashioned man
I'm in love with an old fashioned man
all he wanna do is play guitar and sing
and you won't catch him in no designer jeans

but oh I'm just as broke up as a girl could be
'cause old fashioned him, he don't want modern me

I'm in love with an old fashioned man, yes I am
I'm in love with an old fashioned man
he ain't a year over thirty but he dresses the part
of a dear old granddad with a broken heart

but oh I'm just as broke up as a girl could be
'cause old fashioned him, he don't want modern me

see
I wanna go out and try the finer things in town
his old soul wants to go the forest, find a quarry and swim around
oh but it makes me want him even more

girls stay away from those old fashioned men
girls stay away from those old fashioned men
they'll break you even if you are a good woman
and they all seem to obsess over that romanticized ramblin'

and oh you'll be just as broke up as a girl could be
'cause old fashioned he's don't want no modern she's"

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Wordsong - 5 Fotografias (2002)

Estive a ler o último post que escrevi sobre os Wordsong. Não o devia ter feito, agora não sei o que diga, sem estar a repetir-me.

Continuo a gostar mais de Al Berto que de Pessoa, não me perguntem porquê, que eu não saberei dizer com precisão. Talvez seja por me soar mais experimental, talvez seja por causa do poeta, não sei.

Continuo a achar Pedro D'Orey um dos mais carismáticos vocalistas portugueses. Ninguém faz aquilo que ele consegue fazer com as palavras. Ninguém. Muito para além de cantar, muito para além do mero spoken word.

Continuo a ver naquela banda um envolvimento e uma criatividade sem par que não se esgota na simples adaptação de poemas. Eles são aqueles poemas. É quase como se as teclas fizessem um verso, o baixo outro, a guitarra outro, a bateria outro, a voz outro, as imagens outro ainda. E dessa conjugação nascesse o poema, e não da queda da laranja.

Os Wordsong continuam a ser um dos projectos mais estimulantes da música nacional.

5 Fotografias, para os Wordsong.

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"Apesar de Alexandre ter um olho de cada cor, a fotografia tinha o rigor das imagens a preto e branco."

terça-feira, 21 de julho de 2009

Pearl Jam - The Fixer (2009)

Este ano o grunge está em alta. Para além do regresso dos Alice In Chains, com novo vocalista, e no ano em que celebrámos Ten, álbum seminal do movimento de Seattle e de toda a década de 90, os Pearl Jam estão de volta com mais um álbum de originais, Backspacer.

The Fixer, o primeiro avanço, foi divulgado ontem e já estou a imaginar a divergência de opiniões. Uns dirão que é um grande tema, ao melhor estilo da banda de Eddie Vedder, outros dirão que não passa de mais uma canção rock FM, comercial. Vão dizer que fica no ouvido, que vicia. Para alguns isso é mau, para outros nem por isso.

A mim não me parece uma grande canção, nem tão pouco me parece que os Pearl Jam escolheram para single um tema comercialão. The Fixer não é tipicamente Pearl Jam, porque, a bem da verdade, a banda não tem uma canção-tipo. Não é um tema épico, não é um Even Flow nem um Alive, tão pouco é um Black. Mas, alguém já se esqueceu de Lost Dogs, o duplo álbum que é a prova mais que provada que Eddie Vedder e companhia formam a banda mais versátil do grunge e talvez uma das mais honestas?

Gostei bastante da sonoridade veraneante, do rock simples e directo, do timbre inconfundível e familiar de Eddie Vedder, mas gostei sobretudo da mensagem. Não é preciso estar-se zangado, não é preciso ser-se agressivo, pessimista, negativista, para se ser revolucionário. Ninguém está sempre de mal com a vida. Os Pearl Jam não estão, com certeza, e isso ouve-se. Ouve-se e sabe tão bem...

Até chegar o álbum, Pearl Jam, The Fixer.

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"When something’s dark let me shed a little light on it
When something’s cold let me put a little fire on it
If something’s old I wanna put a bit of shine on it
When something’s gone I wanna fight to get it back again"

domingo, 5 de julho de 2009

Alice In Chains - A Looking In View (2009)

Confesso que fiquei surpreendida quando soube do regresso dos Alice In Chains, 7 anos depois da morte de Layne Staley, 14 depois do último álbum. Depois, aquela sensação dúbia: por um lado, a excitação de ver de volta uma das minhas bandas preferidas de sempre, por outro, o medo de que a nova formação traia a memória saudosa de um dos frontmen mais carismáticos de todo o movimento grunge. Um homem com um timbre inimitável, uma presença incomparável.

Hoje não consigo deixar de tremer ao digitar o endereço do site da banda. Está lá para escuta e download o primeiro avanço para o álbum que vai sair em Setembro. A Looking In View é o single, Black Gives Way To Blue, o disco. Os primeiros sem Staley.

Entro, arrepiada e com pequenas borboletas na barriga. Faço a inscrição para o download, entro no site propriamente dito e a canção começa a tocar. Parece que voltei aos meus 13 / 14 anos, ao quarto de cortinas verdes e à aparelhagem de som (que conservo ainda) em cima da escrivaninha velha de madeira. Parece que voltei ao dia em que, pela primeira vez, pus um disco dos Alice In Chains a ecoar pela casa toda. Andava fascinada com o grunge, já tinha passado pelos obrigatórios Nirvana e Pearl Jam e voltava-me agora para o lado mais negro e pesado do movimento, voltava-me para a banda de Layne Staley. (É engraçado como ainda hoje o meu pai reconhece a música que durante anos deu cor às nossas manhãs: Got Me Wrong, em versão MTV Unpplugged).

Ao ouvir A Looking In View, percebo que devia ter confiado em Jerry Cantrell. Ele só ressuscitaria os Alice In Chains se realmente isso honrasse a vida e obra do amigo Staley. E sendo ele um dos principais compositores, outra coisa não seria de esperar: está lá tudo. Aos primeiros acordes respira-se o espírito Alice In Chains original. Não vou pensar em William DuVall, o novo vocalista, como o substituto de Staley. Ninguém iguala aquela voz. Ninguém. Mas é uma excelente escolha, um vocalista competentíssimo, que se encaixa perfeitamente na sonoridade da banda.

Os Alice In Chains já estão a preparar a tournée europeia. Se vierem a Portugal, vou lá estar sem nenhuma dúvida. Por Staley, por Cantrell, e pela nova vida que deu a uma banda seminal.

A Looking In View, o regresso dos Alice In Chains.

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"A looking in view too long on the outside
Desperate plans make sense in a low life

That's why you'll never tell me heaven's on your mind"

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Phoenix - 1901 (2009)

A conselho do Rui Maia (que, diga-se assim de passagem, tem um excelente Ep acabadinho de sair pela Optimus Discos, grátis e tudo), ando a ouvir Wolfgang Amadeus Phoenix, o álbum de estreia dos franceses Phoenix.

Não sei bem o que dizer. Talvez que gostei do facto de conjugarem boas letras, com um electro-rock interessante. E também gosto muito da voz. Para além de que 1901, o single, me deixa sempre bem disposta.

Fica bem como parte de uma playlist de verão (sem qualquer desprimor, muito pelo contrário) e a mensagem da letra adequa-se ao momento, este em que pareço coleccionar canções sobre o passado, o presente, o futuro e as chatices que cada um deles traz.

Não vou engonhar mais e aqui fica a deliciosa letra na íntegra. 1901 está disponível para download gratuito no site da banda, por isso não há cá desculpas. Toca a procurar, que vale bem a pena!

1901, os Phoenix, uma banda para ficar de olho.

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"Counting all different ideas drifting away
Past and present they don’t matter
Now the future’s sorted out
Watch her moving in elliptical patterns
Think it’s not what you say
What you say is way too complicated
For a minute thought I couldn’t tell how to fall out

It’s twenty seconds till the last call
You’re going hey hey hey hey hey hey
Lie down you know it’s easy
Like we did it over summer long

And I’ll be anything you ask and more
You’re going hey hey hey hey hey hey hey
It’s not a miracle we needed
No I wouldn’t let you think so

Fold it, fold it, fold it, fold it

Girlfriend, oh your girlfriend is drifting away
Past and present 1855 -1901
Watch them built up a meteor tower
Think it’s not gonna stay anyway
Think it’s overrated
For a minute thought I couldn’t tell how to fall out

It’s twenty seconds till the last call
You’re going hey hey hey hey hey hey
Lie down you know it’s easy
Like we did it over summer long

And I’ll be anything you ask and more
You’re going hey hey hey hey hey hey hey
It’s not a miracle we needed
No I wouldn’t let you think so

Fold it, fold it, fold it, fold it"

sábado, 27 de junho de 2009

The Legendary Tigerman & Asia Argento - Life Ain't Enough For You (2009)

Já foi adiado vezes sem conta durante o ano, mas parece que desta é de vez! Femina, o mais recente trabalho de Paulo Furtado enquanto The Legendary Tigerman deve chegar aos escaparates em Setembro e, a julgar pelo primeiro avanço... a espera valeu mais que a pena!

As minhas expectativas já estavam lá nos píncaros. Primeiro, porque se trata de Tigerman e não se pode esperar outra coisa que não um excelente álbum. Depois, pela particularidade de este disco contar com presenças femininas de luxo: Asia Argento, que partilha este Life Ain't Enough For You, Peaches, Becky Lee, Rita Redshoes, Maria de Medeiros, Cláudia Efe, Rita Braga... Luxo é, portanto, uma palavra pequenina para tão certeiras escolhas.

O single é delicioso e mal posso esperar pelo resto do álbum! As vozes da multifacetada artista italiana e de Paulo Furtado fundem-se numa quase perfeição sussurrada, a guitarra acompanha-os, sem sobressaltos. Life Ain't Enough For You é um pequeno rebuçado. Só sei dizer que estes dois meses de espera vão ser duros.

Até lá, Life Ain't Enough For You, The Legendary Tigerman. Mais que obrigatório.

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"I say life ain't enough for you,
You say, baby what you gonna do?"

quarta-feira, 3 de junho de 2009

AC/DC - Jailbreak (1984)

O que é que faz um fã da banda dos irmãos Young e do hard rock em geral a esta hora com um computador portátil no colo a navegar na Internet? Não sei.

Sei que deveria estar em Alvalade por esta hora e não estou.

Decidi dar um tratamento de choque na minha dor de cotovelo, pôr o orgulho de lado, mostrar algum fair-play, acalmar o coração, voltar a respirar... E pôr uns temas dos AC/DC a tocar para que a noite não me pese tanto.

Escolhi Jail Break, mas ainda hesitei entre Sin City, Hell's Bells ou o mais recente Rock 'n' Roll Train. Qualquer uma canção da discografia da banda podia estar aqui.

Ainda do tempo em que o malogrado Bon Scott assumia o microfone e mostrava de que material são feitas as grandes máquinas hard rock, Jailbreak nem sequer é dos temas mais emblemáticos dos AC/DC. Conta a história de um tipo que é preso, mas que decide fazer um motim all in the name of liberty! Adoro os pormenores da música quando o tipo consegue finalmente pôr-se em fuga. É qualquer coisa de épico, embora o final não seja muito feliz.

(depois disto sinto-me um pouco melhor, embora saiba que o mais provável é ter perdido a oportunidade de ver estes tipos para sempre.)

Jailbreak, os AC/DC.

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"Heartbeats they were racin'
Freedom he was chasin
'Spotlights, sirens, rifles firing
But he made it out
With a bullet in his back"

terça-feira, 2 de junho de 2009

Bob Dylan - I Feel A Change Comin' On (2009)

Quero inaugurar a nova cara do 1 Música por Dia com a canção que me tem ocupado os dias.

Como sabem, ando a ouvir Together Through Life tal e qual como ele soa, tal e qual a maneira como Dylan canta os seus 10 temas - como se não houvesse amanhã.

Fazer qualquer coisa como se não houvesse amanhã é fazê-lo com um prazer, um gozo descarado. Como se nada mais importasse no momento, como se já se tivesse visto de tudo, feito de tudo, ouvido de tudo, sentido de tudo e ainda assim o mundo continuasse a ser uma surpresa e a vida a melhor coisa que jamais nos poderia ter acontecido. Gosto de I Feel a Change Comin' On porque é e não é uma canção optimista.

Ora é de um entusiasmo deliciosamente adolescente, ora é a voz de um homem maduro, a quem a vida já iludiu e desiludiu vezes sem conta. Então em que é que ficamos? No desejo, no amor, na alegria de viver? Ou antes nos sonhos que nunca deram certo e nas flores que não conseguiu agarrar? Bob Dylan já o tinha respondido antes e volta a fazê-lo agora. É a mudança, senhores!

É disto que estamos aqui a falar. I Feel a Change Comin' On, Mr. Bob Dylan.
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"Well I'm lookin the world over
Looking far off into the east
And i see my baby comin'
she's walking with the village beast
I feel a change comin' on
and the last part of the day's already gone

We got so much in common
we strive for the same old ends
And I just can't wait
wait for us to become friends
I feel a change comin' on
and the fourth part of the day's already gone

Well life is for love
And they say that love is blind
If you wanna live easy
Baby, pack your clothes with mine
I feel a change comin' on
and the fourth part of the day's already gone

Well now what's the use in dreaming
You got better things to d
oDreams never did work for me anyway
Even when they did come true

You are as porous as ever
Baby you can start a fire
I must be losing my mind
You're the object of my desire
I feel a change comin' on
and the fourth part of the day's already gone

I'm listening to Billy Joe Shaver
And i'm reading James Joyc
eSome people they tell me
I got the blood of the land in my voice

Everybody got all the money
Everybody got all the beautiful clothes
Everybody got all the flowers
I don't have one single rose
Ifeel a change comin' on
and the fourth part of the day's already gone"

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Bob Dylan - Life is Hard (2009)

Bob Dylan é um génio, e continua a sê-lo, sem tirar nem pôr, em 2009. Se alguma poeira de dúvida restasse, Together Through Life está aí para prová-lo.

Não foi fácil esscolher a música do dia, as 10 que compõem o novíssimo álbum de Dylan são irrepreensíveis. Tenho estado a ouvi-las sofregamente desde sexta-feira. Podia ter escolhido a agitada It's All Good, a guitarra viciante de Jolene, a mais rockeira Shake Shake Mama, a deliciosa e quase veraneante I Feel a Change Comin' On, a bluesy My Wife's Home Town, o acordeão de This Dream Of You, os grandes otovermes (no bom sentido) If You Ever Go To Houston e Forgetful Heart ou o single Beyond Here Lies Nothin'. Escolhi Life is Hard, a mais introspectiva das 10 canções, também pelo dedilhar arrepiante da guitarra no início, mas principalmente pelo poema. Quem escreve assim não é gago. É um génio. É que não é fácil - é duro mesmo - pôr em palavras o que a palavra amizade significa, e o quanto as ausências doem.

Por isso, deixo aqui o poema na íntegra. Agora vão procurar a música, porque as palavras ganham outra intensidade na voz rouca e suja de Bob Dylan.

Together Through Life é mais um disco obrigatório. Como todos os outros - sem excepção - de Dylan.

Life is Hard, Bob Dylan.

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"The evening winds are still
I've lost the way and will
Can’t tell you where they went
I just know what they meant
I’m always on my guard
Admitting life is hard
Without you near me

The friend you used to be,
So near and dear to me
You slipped so far away,
Where did we go astray
I passed the old school yard,
Admitting life is hard
Without you near me

Ever since the day,
The day you went away
I felt that emptiness so wide
I don’t know what's wrong or right
I just know I need strength to fight,
Strength to fight that world outside

Since we've been out of touch
I haven't felt that much
From day to barren day
My heart stays locked away
I walk the boulevard,
Admitting life is hard
Without you near me

The sun is sinking low
I guess it's time to go
I feel a chilly breeze
In place of memories
My dreams are locked and barred
Admitting life is hard
Without you near me"

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Jazzanova - Let Me Show Ya (2008)

E pronto. Descobri os Jazzanova.


Um colectivo alemão simplesmente delicioso, que vagueia pelo nu-jazz e pela soul. Que dá um pezinho de dança em África e na bossa-nova brasileira. É electrónica, é chill-out, é tropical.

A quantidade de participações e remixes que já fizeram até assusta! A verdade é que estes tipos não são nenhuns novatos nestas coisas.

Já me rendi a este Let Me Show Ya. Para além de ser quase uma pílula de boa disposição para ouvir logo pela manhã, depois do almoço, ao fim do dia, de madrugada... é um tema muito bem conseguido. Em todos os aspectos. Ritmo viciante, várias camadas para descobrir, um letra com uma mensagem interessante e uma excelente escolha para a voz, Paul Randolph.

Duas resoluções para hoje:
- vou procurar quanto antes Of All The Things, o álbum de 2008
- vou estar lá, no Cool Jazz, quando a banda vier a Portugal.

Let Me Show Ya, Jazzanova.

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"If you're through with love let me show ya
At least a thousand reasons why
You should take your time before you fall again
If you're through with love now's a good time
To wish upon a starry sky
Take your time
Trust that you will win"

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Tó Trips & Tiago Gomes - End Of An Endless Road (2009)

Não li Pela Estrada Fora aos 18 anos, como Tiago Gomes. Devia tê-lo feito. Não sei como é que Kerouac me escapou durante tanto tempo, mas sei que já me marcou. Para sempre.

Não cheguei a ver ao vivo On The Road, o projecto que junta a guitarra de Tó Trips às palavras de Tiago Gomes. Por essa e outras razões, fiquei contente quando que algumas canções tinham sido gravadas e dado origem ao Ep da colecção Optimus Discos Vi-os a Desaparecer na Noite.

Estou cada vez mais apaixonada pelo spokenword, pela forma inconfundível como Tó Trips toca guitarra, pela voz (que ao início me parecia monótona) desarmante de Tiago Gomes e por Kerouac. Para além de o ambiente criado pela dupla ser irrepreensível, o mais fiel que conseguiram ao imaginário de Pela Estrada Fora, a escolha dos excertos foi um tiro perfeito. Tirando uma ou outra canção, também eu teria escolhido aquelas passagens.

Em especial esta, que deu origem à faixa mais arrepiante de Vi-os Desaparecer na Noite. É que, logo aos primeiros acordes de End Of An Endless Road consigo ver Sal sentado no velho molhe por cima de New Jersey, também eu consigo ver Dean Moriarty no seu casaco andrajoso e comido pelas traças a subir para o comboio. Na guitarra de Trips e nas palavras resignadas e melancólicas de Tiago Gomes vejo tudo isto.

Mais um Ep obrigatório.

Tó Trips & Tiago Gomes, End Of An Endless Road.

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"Sem que ninguém, absolutamente ninguém,
Saiba o que vai suceder a ninguém,
Além dos desamparados farrapos do envelhecer,
Penso em Dean Moriarty.
Penso mesmo no velho Dean Moriarty,
O pai que nunca encontrámos.
Penso em...
'What's up, Dean?'"

quarta-feira, 29 de abril de 2009

The Bombazines - Sit Down (2009)

Duas conclusões para hoje:




  1. Não há nenhum EP que eu não goste, nesta primeira leva da Optimus Discos;

  2. Tenho que ver estes tipos ao vivo!

Estes tipos são, desde há dois anos para cá, os Bombazines. Para mim representam também o regresso da voz poderosa e carismática de Marta Ren, a vocalista dos Sloppy Joe.


The Bombazines não chega a ser uma viagem ao passado. É uma viagem intemporal e atemporal. A banda soube ir buscar ensinamentos importantes às sonoridades old school, sem ficar presa numa caixa bafienta. Os Bombazines são os funkers de hoje, com as influências de ontem e de hoje, e com um olho no futuro, porque não.


Os solos de teclados vintage são o máximo, cada faixa parece ter sido afinada ao pormenor até ao ponto extremo de ser completamente natural, e a dupla de vozes é deliciosa. Sim, porque a voz suja de Rui Gon (fantástica em Druks) partilha o microfone com Ren.


Se as cinco canções do EP homónino são o que são - uma sucessão de grandes momentos funk e soul, que parecem ter saído de algum recanto animado dos anos 60 ou 70 - nem quero imaginar o que é que os Bombazines são capazes de fazer ao vivo. Ou mellhor, não quero imaginar, mas ver.


Sit Down, vêm aí os Bombazines.


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"Girl, you may not like my way


You'd better watch out, I'm gonna stay."

terça-feira, 28 de abril de 2009

Madame Godard - Hardly Alone (2009)

Quando abri pela primeira vez o site da Optimus Discos, ouvir isto. Música festiva q.b., às vezes tropical, balcânica, às vezes pop, às vezes rock, às vezes samba, bossa-nova, jazz, outras vezes funk, outras ainda folk, mas sempre, sempre feliz. Os Madame Godard fazem isso mesmo: música feliz, música do mundo, vintage e moderna. É impossível não bater o pé, tamborilar na mesa ou na perna, fazer um trejeito qualquer ao ritmo contagiante de Aurora, o EP que antecede o já muito aguardado álbum de estreia da banda de Viana do Castelo.

Escolher um tema para hoje não foi fácil. Todos eles são obrigatórios (toca a fazer o download!), mas Hardly Alone acabou por ser a música do dia. Um samba-bossa-nova festivo em jeito de homenagem a todos aqueles que nos acompanham, de uma forma ou de outra. Com Marvin Gaye, Elvis, Luther King, Freud, Gilberto Gil, Jacques Tati, Gandhi ou Jack Kerouac quem é que está sozinho?

Hardly Alone, os Madame Godard.

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"You're never alone, take a flashback"

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Dj Ride - Beat Journey (2009)

Já não tenho nenhuma dúvida. Existem soluções - das boas - para a "indústria" musical. E não, as soluções não passam por cortar o acesso à internet a quem faz downloads ilegais. A solução não é inventar mais e melhores sistemas de protecção de dados. Aliás, o problema não é a internet nem o download. Aliás, a solução pode mesmo ser a internet e o download. O download gratuito e autorizado. Talvez este caso da Optimus Discos sirva de exemplo.

Eu também tinha os meus pudores em relação a estas iniciativas de marcas na distribuição e promoção da arte. Conversas aqui e ali fizeram-me pôr esse tipo de preconceito de lado e dar mais importância à qualidade artística do produto e não à marca, que não é nada mais nada menos que um mecenas. E quando o mecenas se rodeia de quem realmente entende do assunto, não há razão nenhuma para que as coisas não resultem.

A verdade é que, se por detrás da Optimus Discos não estivesse Henrique Amaro, o projecto seria mais um falhanço como o Rock Rendez Worten. Mas a iniciativa é boa, Amaro está lá a dar as coordenadas e as bandas escolhidas para esta primeira leva de EP's são, sem sombra de dúvida, parte da nata da música contemporânea portuguesa. O resultado não poderia ser outro: 6 EP's deliciosos, inquestionáveis, de uma qualidade estrondosa.

A música gratuita digital e autorizada, que salvaguarda os direitos e liberdades dos músicos é possível. Mas será que alguém ainda tem dúvidas disso? Para os coleccionadores, os amantes do suporte físico, haverá sempre o CD e o vinil, com edições especiais, limitadas e outras mais-valias associadas. O lugar das grandes editoras também não se extingue, porque há mercado para as duas formas de produzir e distribuir música.

Estas considerações ficam por aqui, por hoje.

E para hoje proponho uma Beat Journey, com Dj Ride. Às vezes nem sei o que dizer. Beat Journey, o EP com o selo Optimus Discos, vem reforçar o que todo nós já suspeitavamos: para além de exímio turntablist, Ride é um produtor genial. É ouvir para crer, como aos 23 anos alguém consegue fazer um trabalho tão maduro e consistente.

Dj Ride, Beat Journey.

terça-feira, 21 de abril de 2009

O Maquinista - O Silêncio é o Paraíso (2009)

O Sérgio Godinho tem razão. Isto anda tudo ligado.

Tenho andado cada vez mais embrenhada no mundo do spoken word. Que género fascinante! Está lá tudo, música, literatura, imagem, performace. Uma mistura que, quando bem feita, arrepia mesmo.
A palavra dita acompanhada por música e a chamada slam poetry não é coisa de hoje. Desde o final da década de 20 que muitos o fazem.
Lá fora os torneios espontâneos de slam enchem os clubes. Os espaços nocturnos enchem-se de poesia. Por cá, as coisas têm o seu tempo. E a seu tempo também a poesia vai invadir os clubes. O caminho já tem sido (bem) trilhado por alguns nomes de referência como Adolfo Luxúria Canibal, Wordsong, Rodrigo Leão, Tiago Gomes e Tó Trips ou, mais recentemente, João Branco Kyron, O Maquinista.

Ambientes musicais densos, uma voz quase sussurrada, cansada e poemas estonteantes. É assim o álbum anónimo d' O Maquinista. Inspirado em nomes como Kerouac ou Burroughs, João Kyron dá ênfase às palavras, envolve-as em música, transpira poesia.

É bom saber que ainda há gente que não tem medo das palavras, de as explorar até às últimas consequências.

(Mal posso esperar pelo silêncio de Junho... Acho que Lisboa não vai ser a mesma depois disto... Não depois de tanta poesia, de tanta palavra, de tanta música...)

Numa piscadela de olho ao que aí vem, O Silêncio é o Paraíso, O Maquinista.

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Eu queria ouvir as palavras entorpecidas pela fúria acumulada durante a minha longa ausência,
Mas ela só me olhava olhos nos olhos.
E o silêncio que havia sido o paraíso,
O silêncio era o abismo.

Eu só queria ouvir novamente o bálsamo contido na sua voz suave,
Mesmo sabendo que a ausência fora longa demais.
Mas ela imóvel olhava-me nos olhos.
E o silêncio que havia sido o paraíso,
O silêncio era o abismo.


O silêncio é o paraíso.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Lou Reed - Walk On The Wild Side (1972)

Hoje entrei numa casa-de-banho pública e estava a passar este Walk On The Wild Side. Parece um tanto ou quanto filmesco, mas aconteceu rigorosamente assim. A verdade é que a música está em todo o lado. Até num moderno wc de shopping.

(Agora que penso nisso, será que mais alguém no mundo presta atenção à música que passa nas casas-de-banho por esse país fora? E se de facto alguém mais repara, que impacto teria essa canção na vida do utilizador do wc? E apesar de saber que a maior parte dos leitores deste blog vai achar esta reflexão ridícula e despropositada, vou partilhar ainda mais este pensamento escabroso: e se alguém for apresentado a este tema mítico de Lou Reed numa casa-de-banho pública, entre uma descarga de autoclismo e outra? É bem possível que nem se aperceba do que isso representa).

Como já devem estar carecas de saber, The Velvet Underground & Nico mudou a minha vida. Enquanto melómana, pelo menos. Posso até dizer que para mim há um A.VU. e um D.VU. Duas eras distintas marcadas pela minha descoberta desse álbum e dessa banda seminal dos finais dos anos 60, e que Lou Reed liderava.

Curiosamente, comecei a ouvir os trabalhos de Reed a solo antes de descobrir os Velvet Underground. Coisas de quem nasceu já na segunda metade dos anos 80... Havia qualquer coisa na música dele que me atraía como um íman, uma subversão, uma transgressão qualquer que eu só viria a perceber cabalmente depois de ouvir pela primeira vez o álbum da banana. Ali estava a resposta.

Se nos Velvet Underground a sonoridade é, de certa forma, mais frenética, cheia de distorção e feedback, em Reed a solo a transgressão, a inovação, é outra. É a forma descomprometida com que debita umas coisas, umas histórias, uns acordes minimalistas, é a forma como (não) canta, como arrasta as palavras.

Neste Walk On The Wild Side isso ouve-se. Haverá coisa mais genial? Uma canção sobre droga, transsexualidade, homens que depilam as pernas, sexo, prostituição e uma Nova Iorque selvagem e frenética, enrolada numa sonoridade pouco comum, com linhas de baixo bem marcadas, um leve escovar, um coro delicioso de doo doo doos e, para terminar em beleza, um saxofone que se desfaz num fade out memorável.

Isto é que é dar uma volta pelo lado selvagem.

Walk On The Wild Side, pela mão de Lou Reed.

_______

"Little Joe never once gave it away
Everybody had to pay and pay

A hustle here and a hustle there
New york city is the place where they said
Hey babe, take a walk on the wild side
I said hey Joe, take a walk on the wild side

Sugar Plum Fairy came and hit the streets
Lookin' for soul food and a place to eat

Went to the Apollo
You should have seen him go go go
They said, hey sugar, take a walk on the wild side
I said, hey babe, take a walk on the wild side
All right, huh"

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Iron Maiden - Heaven Can Wait (1986)

This is a song about sudden death.

Acabei de passar pelo Ípsilon on-line. Ao que parece Prince já tem os três álbuns deste ano prontos e disponíveis no site lotusflow3r.com. Mas para ouvir as novas canções, é necessário desvendar uma charada logo à entrada. Sempre a surpreender, este Prince.

Também por lá encontrei a notícia sobre a exibição em sessão única e "infernal" de Iron Maiden: Flight 666, o documentário que acompanhou os grandes senhores do heavy-metal britânico na tournée do ano passado. Os bilhetes - que custam uns irónicos 6 euros e 66 cêntimos! - já estão à venda. Vou ter de garantir o meu, dê por onde der. E é já dia 21.

Tenho muita música nova para ouvir, talvez as mini-férias da Páscoa dêem para isso. Por agora, recordo Heaven Can Wait, de um ano de grandes colheitas (!), a canção que, apesar de não ter sido single, é o cartão de visita para Somewhere in Time, o 6º (!) álbum de originais dos Iron Maiden.

Se for possível manter a consciência na altura exacta em que o coração deixa de bater, não tenho a menor dúvida que o sentimento é este que Steve Harris descreveu.

Heaven Can Wait, Iron Maiden.

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"Can't understand what is happening to me,
This isn't real, this is only a dream,
But I never have felt, no, I never have felt this way before,
I'm looking down on my body below,
I lie asleep in the midst of a dream,
Is it now could it be that the angel of death has come for me?
I can't believe that really my time has come,
I don't feel ready, there's so much left undone,
And it's my soul and I'm not gonna let it get away.

Heaven can wait,
Heaven can wait,
Heaven can wait,
Heaven can wait till another day."

terça-feira, 24 de março de 2009

Pearl Jam - Alive (1991)

Tenho tido pilhas de trabalho na secretária de casa e na do escritório. Aparecem coisas para fazer de todos os cantos e, na verdade, isso sabe bem. Apesar de o tempo não esticar, como todos gostaríamos.
Também tenho em lista de espera alguma música nova: uns temas que o meu namorado desencantou do fantástico músico japonês Akira Yamaoka e os novos álbuns dos The Whitest Boy Alive e dos Phoenix, duas bandas muito interessantes, em registo mais electro, que o Rui Maia me aconselhou a ouvir.

(Ah, há quanto tempo não nos sentamos no tapete da sala, cada um com uma pequena pilha de discos ao lado, a fazer descobertas desta ou daquela banda? Há quanto?)
Quero ouvi-los com a calma que merecem, por isso a sugestão de hoje é outra. Dou-me conta que um ano de blog chega para falar várias vezes dos Pearl Jam e por isso não me vou alongar na exposição. Ontem foi dia Pearl Jam em mim. A banda de Eddie Vedder decidiu reeditar Ten, o álbum de estreia, o álbum de Even Flow, Jeremy, Black e deste Alive. Um dos discos que marcou a minha adolescência, todos os anos 90 e, permitam-me isto, a história mais recente da música no mundo. Está lá tudo o que é preciso: raiva grunge, a história de um miúdo que se suicida na escola, uma das melhores letras rock de todos os tempos. A Blitz dedica a sua próxima edição aos Pearl Jam, com uma entrevista sentida a Vedder, e a todo o movimento grunge.
(Gostava de encontrar uma foto minha de camisa de flanela - ou a própria da camisa axadrezada - , mas as minhas memórias ainda não estão assim tão informatizadas...)
Ainda hoje o riff inicial de Alive me arrepia tanto como na altura em que enchia os meus cadernos da escola com esta e outras letras. E depois há a forma como Vedder conta esta história, como se envolve no diálogo de uma família estilhaçada.
Ten é obrigatório.
Pearl Jam, Alive.
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"Is something wrong, she said
Well of course there is
You're still alive, she said
Oh, and do I deserve to be
Is that the question
And if so...if so...who answers...who answers...
I, oh, I'm still alive
Hey I, oh, I'm still alive
Hey I, but, I'm still alive
Yeah I, ooh, I'm still alive"

segunda-feira, 9 de março de 2009

GAC - A Cantiga é Uma Arma (1976)

A pretexto de um trabalho que tenho agora em mãos, mergulhei a fundo na discografia de José Mário Branco.

Uns dizem que esta minha geração é menos politizada, menos interveniente, menos preocupada. Outros dizem que não, que participamos mais, mas de outras formas. Não queremos saber de partidos nem de hinos, e só vamos à Festa do Avante! uns pelo amor à música e ao espírito festivaleiro, outros porque é cool. Fazemos downloads de borla, não compramos discos nem vinis, mas vamos a cada vez mais concertos. Dizemos merda nos versos das nossas canções, nelas chamamos filhos da puta aos políticos, mas não estamos imunes à censura do dito mundo livre. Há quem queria sempre por uns pis e scratches nas palavras menos politicamente correctas, há quem não tenha pudor em banir uma canção ou um álbum das ondas do éter moderno.

Para a minha geração, o 25 de Abril é mais um feriado. Mas talvez não tenha havido nunca uma geração que preze tanto a sua liberdade, a sua privacidade, os seus direitos.

Bom, este não é o lugar para explorar orientações políticas. Como diz o grande cantor de intervenção, José Mário Branco, tudo depende da bala e da pontaria.

A Cantiga é Uma Arma, o Grupo de Acção Cultural de José Mário Branco.

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"A cantiga é uma arma
eu não sabia
tudo depende da bala
e da pontaria
Tudo depende da raiva
e da alegria
a cantiga é uma arma
e eu não sabia"

quinta-feira, 5 de março de 2009

Rita Lee - Baila Comigo (1980)

Rita Lee é aquele bicho estranho. Há quem lhe chame Vovó Rock, e na verdade, a cantora e compositora brasileira lançou-se no final dos anos 60 e passou as décadas de 70, 80, 90 até aos dias de hoje, sempre a compor, sempre polémica, sempre sem papas na língua.

Ouvi hoje, quase por acaso, este Baila Comigo, um tema delicioso, daqueles que apetece cantar quando a Primavera se demora, e é urgente pensar em algo mais que ventanias, vendavais, aguaceiros e as milhentas coisas que temos para fazer.

Baila Comigo, Rita Lee.

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"Se Deus quiser,
Um dia eu quero ser índio
Viver pelado pintado de verde
Num eterno domingo

Ser um bicho-preguiça,
Espantar turista
E tomar banho de sol, banho de sol,
Banho de sol, sol

Se Deus quiser,
Um dia acabo voando
Tão banal assim como um pardal
Meio de contrabando

Desviar do estilingue
Deixar que me xinguem
E tomar banho de sol, banho de sol,
Banho de sol, banho de sol
Baila comigo, como se baila na tribo

Baila comigo, lá no meu esconderijo

Se Deus quiser,
Um dia eu viro semente
E quando a chuva molhar o jardim
Ah, eu fico contente
E na primavera vou brotar na terra
E tomar banho de sol, banho de sol,
Banho de sol, sol

Se Deus quiser,
Um dia eu morro bem velha
Na hora H quando a bomba estourar
Quero ver da janela
E entrar no pacote de de camarote
E tomar banho de sol, banho de sol,
Banho de sol, banho de sol

Baila comigo, como se baila na tribo
Baila comigo, lá no meu esconderijo"

terça-feira, 3 de março de 2009

Jack White & Alicia Keys - Another Way To Die (2008)

Não sou fã da saga James Bond, como todos lá em casa. Não vi, nem tenciono ver num futuro próximo, Quantum Of Solace. Alicia Keys não é uma artista da minha eleição. Gosto do trabalho de Jack White, nos White Stripes, mas nada que me tire o sono. Então porque é que Another Way To Die me soa tão bem?

Não sei.

Tenho algumas suspeitas. Desde logo, é interessante ver um rocker e uma artista r&b como estes dois em dueto, o 1º de todas as bandas-sonoras de filmes do 007. Depois, parece-me que este é o tema que conjuga melhor o glamour associado ao universo Bond com uma certa tensão irreverente, dada sobretudo pelos dedos (na guitarra e na produção) de Jack White.

Fascina-me, sobretudo, que o lado mais "clássico" do tema seja quebrado pela guitarra de White, que funciona como um quase improviso, como um pisar fora do risco. O registo dos dois também é delicioso. É pop, é soul, é rock também.

Não sendo brilhante, é uma ousadia bem interessante de ouvir.

Jack White e Alicia Keys, Another Way To Die.

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"A door left open, a woman walking by
A drop in the water, a look in the eye
A phone on the table, a man on your side
Or someone that you think that you can trust
It's just another way to die"

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

James Brown - Get Up (I Feel Like Being a) Sex Machine (1970)

Um espírito funky apoderou-se de mim logo nas primeiras horas da manhã. Get Up (I Feel Like Being a) Sex Machine instalou-se - qual otoverme! - ao ponto de desejar ser dia de after-hours, poder abandonar o trabalho e passar uma hora ou duas a dançar - dançar, vejam só, eu que não gosto de dançar... - numa cave escura e voltar, depois, alegremente, às rotinas do dia-a-dia.

O funk tem destas coisas. Liberdade, espontaneidade, ritmo. Faz-me ter vontade de explorar ainda mais a música negra, a colored music, como diz Kerouac. O legado que os afro-americanos têm deixado à música mundial estende-se por décadas e décadas. O jazz, o bop, os blues, o funk, a soul, o r&b, o hip-hop... e sei lá eu mais o quê. Uma herança impressionante e da qual nem sempre temos consciência.

Por isso, a música de hoje é um dos temas mais emblemáticos de James Brown, o pai do funk. Há coisas que me desarmam neste género: as palavras e frases repetidas até à exaustão - que poderiam não dizer nada - criam um sentido de comunhão incrível, um diálogo quase; os ritmos irresistíveis e a alegria, sobretudo a alegria com que estes soul brothers estavam em palco. Não há nada assim.

Get Up (I Feel Like Being a) Sex Machine, James Brown.

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"Fellas, I'm ready to get up and do my thing (yeah go ahead!)
I wanta get into it, man, you know (go ahead!)
Like a, like a sex machine, man, (yeah go ahead!)
Movin' and doin' it, you know
Can I count it off? (Go ahead)

One, two, three, four!

Get up, (get on up)
Get up, (get on up)
Stay on the scene, (get on up), like a sex machine, (get on up)"

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Pearl Jam - Drifting (1999)

Sei que estou em falta para com os leitores destas músicas do dia. Por ocasião do 1º aniversário deste cantinho prometi algumas novidades, e elas chegarão a seu tempo. A velha desculpa, a do tempo.

Ando a ler On The Road, de Jack Kerouac. Estou fascinada, fazia-me falta ter um livro destes na cabeceira. Uma escrita urgente e inflamada, simples, ao serviço da memória. Este é também um livro quase musical. Kerouac era um obcecado pelos sons do bop, o género mais em voga naqueles anos 40. Faz descrições apaixonadas dos músicos que sopram, mesmo sem soprar, das canções que saíam de jukeboxes, guitarras de mexicanos ou da sua própria mente, de onde Billie Holiday poderia saltar a qualquer momento.

Pus a tocar faixas aleatórias e, coincidência ou não, entrou este Drifting, tema single do Natal de 99 especial para o clube de fãs dos Pearl Jam. Eddie Vedder e Stone Gossard gravaram o tema décadas depois de Kerouac ter inventado a beat generation, mas haverá melhor forma de descrever a filosofia subjacente ao movimento que este Drifting? Ou pelo menos, haverá melhor forma de descrever os novos beatniks?

Drifting, os Pearl Jam.

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"Drifting, drifting, drifting away.
I got myself a mansion, then I gave it away.
It's not the world that's heavy, just the things that you save.
And I'm drifting, drifting away.

Drifting, drifting, drifting uh-huh
I rid myself of worries, and the worries were gone.
I only run when I want to and I sleep like a dog.
I'm just drifting, drifting along.

The suitcoats say, 'There is money to be made".
They get so damn excited, nothing gets in their way
My road it may be lonely just because it's not paved.
It's good for drifting, drifting away.

Drifting, drifting, drifting, uh huh.
I feel like going back there, but never for long.
I sometimes wonder if they know that I'm gone.
I'm just drifting, drifting along.
Drifting, drifting along. Drifting, drifting along."

domingo, 15 de fevereiro de 2009

The Red Hot Chili Peppers - Aeroplane (1995)

Faz hoje precisamente um ano que comecei a escrever aqui.

Já andava com esta ideia fisgada há algum tempo. A minha melomania tornava urgente a criação de um espaço onde poderia partilhar descobertas, onde poderia partilhar canções. 1 Música Por Dia era o título certo. Sabia que seria difícil por aqui uma canção por dia. Não porque não ouvisse (no mínimo) uma música todos os dias, mas porque nem sempre as músicas se conseguem traduzir facilmente em palavras. Também há outros dias em que não temos vontade de partilhar ou simplesmente não arranjamos tempo para o fazer, apesar da urgência.

Inaugurei este blog com Oh, Me, dos Meat Puppets. Tinha comprado o MTV Unplugged dos Nirvana em DVD e fiquei impressionada com a banda dos irmãos Kirkwood, os convidados para esta derradeira aparição de Kurt Cobain em palco. Corri tudo à procura de álbuns, vinis, cassetes - o que fosse - dos Meat Puppets, mas nem a Carbono tinha.

Hoje, exactamente um ano depois, muitas canções depois, alguns comentários depois, é engraçado espreitar as estatísticas (que não instalei, com pena minha, desde o início). No top 5 das canções mais vistas está... O Sr. Extraterrestre, de Amália Rodrigues, com 318 visitas! Nunca pensei que aquela relíquia que ostento com orgulho na minha sala de estar - o vinil desta bizarra canção de Carlos Paião para Amália - levasse o prémio. Significa que ainda há muita gente a pôr estas palavras mágicas nos motores de busca, a principal fonte de tráfego de 1 Música Por Dia.

Mas a grande surpresa do ano neste cantinho é o segundo lugar, com 212 visitas. Outro Futuro, dos Balla. Apesar de não ter a visibilidade que merece, o projecto do dinâmico Armando Teixeira, não é tão underground como isso. Mas as estatísticas, como tudo, não são infalíveis. Quem sabe se estes resultados não vieram, em parte, das visitas daqueles que procuram "outro futuro" em sites de astrólogos, centros de empregos e afins? Prefiro pensar que não, que tudo aqui é música e nada mais.

Sem surpresas, Quem é Quem, o primeiro single do novo álbum, ainda sem nome, dos Xutos & Pontapés, ficou em 3º lugar no ranking 1 Música Por Dia. Foi o responsável pelo maior pico de visitas num só dia, o dia seguinte à comemoração dos 30 anos da maior banda de rock nacional. Em cerca de um mês, conseguiu angariar 135 visitantes para este cantinho.

Por último, fiquei contente com os "resultados" de Fireworks, dos X-Wife. 89 visitas podem não significar nada, são números, nada mais, mas não deixa de ser interessante analisá-los. Um dos melhores regressos do ano que passou, sem dúvida. Apaixonei-me por Are You Ready For The Blackout?, e tenho a certeza que não fui a única.

Talvez tenha sido o menos musical de todos os posts de 1 Música Por Dia. Mas serve para dizer que, dentro em breve, este cantinho sofrerá alguns upgrades. Já estava na hora. Até lá haverá sempre música, pelo menos uma por dia.

A de hoje é dos Red Hot Chili Peppers, do álbum "perdido" entre os dois grandes hypes Blood Sugar Sex Magik, de 91 e Californication, de 1999. One Hot Minute foi considerado um dos álbuns mais negros da banda e, para além deste Aeroplane e de My Friends, não lançou grandes singles. Apesar de tudo tem a participação de peso de Dave Navarro na guitarra. Escolhi-a porque queria uma boa definição para música. Aeroplano não me pareceu mal.

The Red Hot Chili Peppers, Aeroplane.

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"I like pleasure spiked with pain and
Music is my aeroplane
It's my aeroplane
Songbird sweet and sour Jane and
Music is my aeroplane
It's my aeroplane

[...]

Just one note
Could make me float
Could make me float away"

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

The Velvet Underground - The Black Angel's Death Song (1967)

Com a vossa licença, vou voltar a The Velvet Underground & Nico, o (meu) melhor álbum de 2008. Porque por mais vezes que descasque a "banana" e a ponha a rodar no rádio, o sentimento é o mesmo. E é mais ou menos isto: estes tipos são uns génios. Como se eu estivesse em pleno final dos 60's, a viver a experiência do psicadelismo e a assistir à emergência de Lou Reed, John Cale, Nico e os Velvet Underground. A verdade é que a cada audição, tudo me parece mais novo e mais genial e mais experimental. Mesmo depois de terem aparecido toda uma série de coisas novas depois deles, os Velvet Underground continuam a ser inovadores.
Pelos menos aos meus ouvidos.

Para hoje escolhi esse OVNI musical que é The Black Angel's Death Song. Enquanto escrevo arrepio-me com aquela guitarra propositadamente desafinada, com as melodias sem sentido, o feedback, o estilo quase spoken word que Reed adopta, os ruídos que assaltam a canção como se fossem sopros ou fugas de ar de máquinas industriais.

Lou Reed e John Cale sempre disseram que o tema não significava nada, que era apenas uma sucessão interessante de sons, os dos instrumentos e os das palavras ditas. Houve quem identificasse em The Black Angel's Death Song uma mensagem comunista, um apelo à liberdade de escolha. Nada disso, os autores mantinham a justificação.

Não sei se a canção de The Velvet Underground & Nico quer ou não transmitir uma mensagem, não sei se é ou não um hino ao Comunismo ou a outra ideologia qualquer, não sei se é ou não uma mensagem encriptada, como outros disseram. Não sei e, na verdade, que importa isso perante uma pedaço tão significativo de arte avant-garde? Talvez o objectivo de Reed e Cale fosse mesmo esse, o de realçar a liberdade, não só de escolha, como a de criar. Sem barreiras nem sentidos nem outros condicionalismos. Porque a arte não precisa de ter um sentido óbvio nem sequer visível para ser entendida e apreciada.

The Black Angel's Death Song, The Velvet Underground.

Ainda preciso de dizer que o álbum da banana é obrigatório?

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"If the stone glances off
Split didactics in two
Leave the colors of the mouse trails
Don't scream, try between
If you choose, if you choose, try to lose
For the loss of remain come and start

Start the game I che che che che I
Che che ka tak koh
Choose to choose
Choose to choose, choose to go"

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Ao que parece os AC/DC vão trazer Black Ice a Lisboa já em Junho! Esperamos que sejam verdadeiras as fugas de informação vindas da banda que lhes faz as primeiras-partes! Dê por onde der, vou pegar no meu irmão e vamos os dois ver Angus Young e companhia!

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Lulu Blind - Foge de Ti (2001)

Foi em 2001 que conheci Tó Trips.
Foge de Ti, primeiro single para o álbum com o mesmo nome, chegava às rádios e eu chegava aos Lulu Blind.
Era rock do bom, puro e duro. A voz arranhada de Trips, temas difíceis, ambientes áridos, letras improváveis.
Foge de Ti, o álbum, era um objecto estranho na minha estante adolescente.
Donuts no céu...
Coisa feia esta de citar-me a mim mesma. Mas o motivo é mais que justo. Não sei há quanto tempo não me dava tanto gozo pôr um disco a tocar.
Em Abril falava do meu "reencontro" com Trips, a propósito de Lusitânia Playboys, o último trabalho dos Dead Combo. Hoje, voltei a cruzar-me com o guitarrista. Magro, blusão de cabedal, de preto da cabeça aos pés, cabelo desgrenhado, atravessou o escritório sempre naquele passo acelerado, de quem está só de passagem. A pressa não o faz deixar de dizer um afável mas distraído bom dia e um adeus, sempre em andamento.
Por mais anos que passem, por mais projectos em que o veja, aquela voz rouca inconfundível vai fazer-me sempre lembrar de Foge de Ti, o tal álbum branco do anjo astronauta, o terceiro e último na carreira dos Lulu Blind.
Sorri, voltei à minha peça no computador e estava assim encontrada a música do dia. A música não. As músicas do dia. Porque hoje quero propor um álbum inteiro. Vou regressar àqueles dias em que Foge de Ti passava na rádio que deixava sintonizada para adormecer.
Na altura a Internet não era recorrente nas nossas vidas. Ouvia aquele tema tão marcante na rádio e pensava que um dia, fosse como fosse, haveria de conseguir saber onde comprar aquele álbum. E aconteceu. Na secção de música de um impessoal hipermercado. Perdido no meio de compilações e música comercial, reluzia a brancura de Foge de Ti. Não pensei duas vezes e trouxe-o comigo.
Aqueles temas áridos não eram de fácil digestão para ouvidos tão verdes. Talvez tenha sido por isso que posso apontar Foge de Ti como um dos álbuns que mais significado tiveram para mim.
Soube-o hoje, quando o fui resgatar à estante, lhe limpei o pó e o pus de novo a rodar.
Políticas a metro, homem com cabeça de insecto, democracias gastas no tempo..., assim começa Eles. Politicamente incorrecto, aquilo que sou fã e acredito..., e continuava.
E depois havia aquele tema completamente surrealista, a faixa escondida, uma versão de Susto. Ouvia-a vezes sem conta, vezes seguidas, e imaginava filmes e histórias ocultas naquela canção que ainda hoje me arrepia. Baseada nela, escrevi um pequeno guião para uma curt(íssim)a-metragem sobre um tipo que se suicidava num velho barracão abandonado na estrada que dava para a escola. (tenho de ver onde pára isso...).
Se bem me lembro, Atirar-te ao Ar também chegou a ser single. Eu por ti sempre fui assim. Vou A Marte, até ao fim... Delicioso.
Depois havia a doce amante Heroína, que era meio bichinho, meio elefante. Os donuts no céu, de Foge de Ti. A sensualidade delirante de Vento (talvez um dos melhores temas do álbum). A fantástica história do Johnny que acordou de manhã, deu um beijo à mamã e fez-se ao mundo. A urgência de Hoje e tantas outras histórias... Tantas.
É mais que provável que nada disto faça sentido para si, que está a ler este blog. Não se preocupe por isso.
Para além do encontro fortuito de hoje, tenho me encontrado muitas outras vezes com Tó Trips. Para além dos Dead Combo, no fantástico projecto Reservoir Dogs, que revisita a banda-sonora dos filmes de Tarantino, nas ilustrações que assina (já em Foge de Ti o fazia!) como MacKintóxico, e nesta coisa simplesmente brutal que é On The Road, um espectáculo que Trips partilha com o multifacetado Tiago Gomes, em torno do livro com o mesmo nomes de Jack Kerouac, o pai da geração beatnik.
Por tudo isto (e desculpem qualquer coisinha), a música (e o álbum do dia) é Foge de Ti, dos Lulu Blind.
______
"Corre
Foge de ti.
Donuts no céu.
Tu e eu"

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

T-Bone Walker - Call It Stormy Monday (1943)

Ontem vi finalmente O Estranho Caso de Benjamin Button. Depois de ter lido todo o tipo de críticas, boas, más, assim-assim, o filme agradou-me mesmo. Por várias razões e uma delas tem o seu quê de musical, ou não fosse eu uma melómana do pior. E como este é um blog de música, deixo as partes cinematográficas para quem realmente percebe do assunto.

A curiosa história do tipo que nasce velho e rejuvenesce à medida que os anos passam acontece nesse santuário do jazz e dos blues que é New Orleans, precisamente na época de florescimento do género banhado pelo delta do Mississipi. É delicioso, não posso negar, ouvir aquelo acento típico, aquela forma tão peculiar de falar, legado de negros, de homens e mulheres que me habituei a ouvir nos melhores standards de jazz e blues.

Boa parte da acção desenrola-se entre as décadas de 30 e 50, logo o filme é muito marcado por aquela coisa tão típica que paira no ar um pouco por todo o Louisiana. Aquela cadência jazzy, não sei bem explicar.

Call It Stormy Monday, um blues típico, cantada por vários artistas em todas as gerações, não faz parte da banda sonora de O Estranho Caso de Benjamin Button, mas bem podia fazer. Escolhi a versão de 1943 de T-Bone Walker para hoje. Se existe canção que descreve como se vivia na New Orleans dos anos 40, essa canção é esta.

Deliciosa no ritmo, na guitarra que sobressai, no piano lá atrás, no saxofone que de quando em vez também se impõe. E a voz a de Walker, um desalento tal que só podia existir ali, naquele momento e naquele lugar da história.

Call It Stormy Monday, T-Bone Walker.

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They call it stormy Moday, but Tuesday's just as bad
They call it stormy Moday, but Tuesday's just as bad
Wednesday's worse, and Thursday's also sad

Yes the eagle flies on Friday, and Saturday I go out to play
Eagle flies on Friday, and Saturday I go out to play
Sunday I go to church, then I kneel down and pray

Lord have mercy, Lord have mercy on me
Lord have mercy, my heart's in misery
Crazy about my baby, yes, send her back to me

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Viviane - Serenata à Chuva (2007)

Chove. Têm chovido dias completos. Comprei um guarda-chuva amarelo, no Chinês. Foi uma vida efémera a do pobre guarda-chuva que agora jaz num pequeno caixote-do-lixo da estação do Cais do Sodré.

Tanta chuva e tanto guarda-chuva pelas ruas de Lisboa deu-me vontade de ouvir esta Serenata à Chuva, do álbum homónimo de Viviane, o segundo na carreira a solo da vocalista dos Entre Aspas. As razões são mais ou menos as mesmas que me levam a pôr água na chaleira para fazer um chá, daqueles que fundem sabores. Uma mistura fértil de fado com tango, chanson française, poesia e spoken word. E aquele sotaque delicioso meio algarvio, meio francês, com tiques de fadista.

Serenata à Chuva, com um poema magnífico de Rosa Alice Branco e a participação especial do cubano Mário Riva, a dar uma dimensão incrível à canção, o contrabaixo e as suaves escovas a pontuar, é a música de um dia chuvoso.

Viviane, Serenata à Chuva.

______

"Como o amor altera o sentido da chuva,
Sim, como ela se eleva no ar
E as frases se colam ao vestido.
No interior da pele o poema mudou
Desde que entraste no guarda-chuva
Esquecido a um canto do armário


Talvez o amor seja tudo amar
Sem excepção

E eu que nunca uso guarda-chuva
Assino incondicionalmente este poema"


______

Queria partilhar uma ou duas coisas ou mais convosco: gosto de guarda-chuvas, mesmo quando viram com o vento, gosto porque dão um outro colorido à cidade cinzenta por causa da chuva, porque lançam um véu misterioso sobre as pessoas que o usam. Qualquer dia mudo o título deste blog para O Guarda-Chuva Amarelo. Só porque sim.